Após ter sua distribuição nos EUA censurada pela denominação, livro de importantes pesquisadores adventistas sobre Ellen G. White é disponibilizado gratuitamente; leia aqui a introdução e inscreva-se para traduzir o livro com a revista Zelota
Por Alexander Carpenter | editor-chefe da Spectrum Magazine. Traduzido e adaptado do original em inglês por André Kanasiro para a revista Zelota.
No dia 8 de novembro, a Spectrum, a Adventist Today e a Igreja Adventista do Sétimo Dia (IASD) da Universidade de Loma Linda realizaram uma apresentação de Reclaiming the Prophet (“Resgatando a profetisa”), um livro sobre Ellen G. White que foi publicado pela editora adventista Pacific Press. Entretanto, devido a uma pausa na distribuição causada pela denominação, Reclaiming the Prophet pode ser o livro adventista mais importante do ano — e poucas pessoas o leram.
Editado pelo historiador Eric Anderson, ex-presidente de duas instituições adventistas de educação superior, o livro contém contribuições de George Knight, Niels-Erik Andreasen, Terrie Dopp Aamodt, Gilbert M. Valentine, Denis Fortin, Larry Geraty, Jonathan Butler, Don McAdams e Ron Graybill, entre outros. Este grupo representa autores que, somados, escreveram mais de 100 livros publicados. Ele inclui presidentes muito bem-sucedidos de várias instituições adventistas de educação superior.
O livro foi promovido publicamente por administradores muito respeitados, experientes e cuidadosos, como Lowell Cooper, ex-vice-presidente da Associação Geral (AG), e Gordon Bietz, presidente emérito da Southern Adventist University. Ainda assim, o Ellen G. White Estate se esforçou — publicamente e nos bastidores — para impedir que o livro fosse distribuído entre adventistas. Em solidariedade aos autores, cujo trabalho merece ser lido ao invés de criticado em um vácuo, a Spectrum publicou um PDF do livro completo para ser lido e baixado gratuitamente. Da mesma forma, a Zelota está traduzindo o livro para disponibilizá-lo gratuitamente em português e aceita voluntários para agilizar a tradução. Caso tenha interesse em participar, inscreva-se aqui.
Com uma equipe tão distinta de participantes e uma mensagem centrada na apreciação da Sra. White, primariamente por seus escritos devocionais e suas perspectivas espirituais, por que o White Estate interveio? Eles explicaram: “A natureza fundamental do dom profético e o estabelecimento divino da Igreja Adventista do Sétimo Dia como movimento remanescente de profecia bíblica são mais desconstruídos pelas omissões do livro do que pelo conteúdo presente em suas páginas.”
O que ele define como “omissões” inclui trabalhos de seus próprios membros — em sua maioria defesas apologéticas, em suas próprias palavras, do “uso de fontes por Ellen White, do papel de suas assistentes, inspiração, falibilidade, e a relação entre os seus escritos e as Escrituras”. Qualquer acadêmico tem liberdade para rejeitar a obra de seus pares devido à omissão de certas fontes, mas o White Estate foi além: ele fez uso da força.
Ao pausar a distribuição do livro, o White Estate ultrapassou os limites da ética acadêmica adventista e colocou poder acima de princípios. Esta ação vai além de um reitor de faculdade encorajando um professor a inspirar a crença de seus alunos — é uma ação de má fé contra acadêmicos e líderes denominacionais altamente respeitados que trabalharam com muita honestidade para demonstrar que uma rejeição completa a Ellen White não se justifica com uma abordagem holística às evidências disponíveis.
Ao usarem seus cargos eclesiásticos para censurar um livro tão bem escrito e benigno quanto Reclaiming the Prophet, os pesquisadores do White Estate perdem crédito como acadêmicos adventistas e tornam questionáveis seu comprometimento com a excelência e o diálogo em nossa comunidade.
Talvez eles estejam confusos quanto à missão que receberam — algo, convenhamos, monumental.

Estaria o White Estate seguindo a vontade de Ellen White?
Buscando outras opiniões, entrei em contato com Julius Nam, um advogado e historiador que articulou uma conferência importante para a criação de Ellen Harmon White: American Prophet (“Ellen Harmon White: Profetisa americana”), publicado pela Oxford University Press.
Embora reconheça que o White Estate, uma organização privada, tenha o direito de fazer objeção a obras das quais discorda, Nam questionou a influência desproporcional que a AG concede ao White Estate em questões de teologia e história, especialmente no que tange o papel da Sra. White na vida da IASD.
Nam recordou que o White Estate reconhece os objetivos originais da organização segundo o testamento da profetisa, escrito três anos antes da sua morte, os quais eram: “(1) manter a posse dos direitos autorais pelos escritos de Ellen White, assim como cuidar e promover seus livros na língua inglesa; (2) preparar seus manuscritos para tradução e publicação em outros idiomas, assim como promovê-los; e (3) manter a custódia dos manuscritos e outros arquivos, assim como selecionar os arquivos de manuscritos de Ellen G. White para publicação.”
O White Estate acrescenta que seu conselho “agora carrega uma quarta responsabilidade, a qual evoluiu naturalmente ao longo dos anos — familiarizar os adventistas do sétimo dia e outros com a Sra. White e sua obra”. Nam observou: “Se você ler atentamente o testamento de Ellen White, não há nenhuma sugestão de que o White Estate deveria ter poder ou autoridade sobre como os escritos da Sra. White devem ser interpretados, e muito menos sobre a função teológica ou eclesiástica que ele deveria ter.” Nam prosseguiu:
“No fim, a aparente falta de distinção funcional significativa entre a IASD e o White Estate está se demonstrando um verdadeiro problema, visto que o ele — o qual, novamente, é só uma entidade privada — está exercendo uma influência indevida sobre como a IASD se relaciona teológica, histórica e eclesiasticamente com Ellen White e seus escritos. O White Estate é sem dúvida uma parte importante da IASD, e deu contribuições incalculáveis para a vida da IASD.”
“Mas ainda assim, é uma entidade privada — a qual certamente deveria ter alguma voz, mas não ser a voz de autoridade para a IASD, mesmo que esteja alugando um espaço no prédio da AG,” acrescentou Nam.
A Feiticeira Branca
Em outras palavras, o White Estate tornou-se algo similar à Feiticeira Branca de As crônicas de Nárnia, de C. S. Lewis. Ambos usam seu poder para limitar discussões abertas, criando um inverno de medo, sem generosidade. Ele congelou a distribuição de Reclaiming the Prophet e parece ter congelado a Sra. White como uma estátua para sempre.
O livro de Anderson e seus colegas, no entanto, busca resgatar a Sra. White não diminuindo sua importância, e sim demonstrando que ela permanece imponente mesmo sem o pedestal gigantesco do White Estate. Seu pedestal de ferro e barro é frágil, aparentemente construído como instrumento estratégico para converter as experiências espirituais e os dons de liderança da Sra. White em ferramentas rígidas para a autoridade magisterial contemporânea. Já são muitos os adventistas que, buscando a verdade, não viram utilidade neste monumento; quando ele desmorona, muitos infelizmente perdem sua fé, seus laços familiares, e os benefícios de ser parte da comunidade adventista.
Os acadêmicos que contribuíram com Reclaiming the Prophet oferecem uma alternativa construtiva à apologética defensiva do White Estate. Conforme escrito por Lowell Cooper,
“Reclaiming the Prophet é, na minha opinião, uma contribuição oportuna para a compreensão do papel único de Ellen White e sua influência impressionante na história dos adventistas do sétimo dia. O livro apresenta uma visão multidimensional dela como pessoa, da época em que viveu, e do impacto crucial que ela teve — e continua a ter — nas vidas de milhões de pessoas. Ao mesmo tempo, ele aborda alguns equívocos e percepções duradouras que tipicamente se acumulam devido à familiaridade limitada que muitos têm com indivíduos distintos como Ellen White. Eu aplaudo esses escritores por suas perspectivas e informações que corrigem as opiniões polarizadas e distorcidas sobre Ellen White que são encontradas atualmente.”
Cooper acrescentou:
“Sem dúvida estes capítulos motivarão novas perguntas e motivarão respostas contrastantes à nossa compreensão da comunicação divina com a humanidade, tanto na antiguidade quanto em tempos atuais. Os leitores deste livro sairão com uma compreensão mais profunda de Ellen como pessoa, colega, e mensageira de Deus.”
“Não resta nenhum bom motivo para que Reclaiming the Prophet seja escondido pelos líderes da denominação na AG, na Divisão Norte-Americana, e no White Estate. Como a Feiticeira Branca, eles reagiram de forma desequilibrada. A menos que descongelem a distribuição do livro, os diplomas que acompanham seus nomes parecem não representar mais que sua disposição a usar a educação para acumular poder e usá-lo contra acadêmicos e administradores de universidades. Quanto mais instrumentalizam os símbolos da pesquisa acadêmica contra seus próprios pares, mais esses líderes prolongam o apagão branco do adventismo e nosso inverno de descontentamento.”
A Zelota está traduzindo o livro para disponibilizá-lo gratuitamente em português e aceita voluntários para agilizar a tradução. Caso tenha interesse em participar, inscreva-se aqui.
Introdução de Resgatando a profetisa
Por Eric Anderson | Historiador e ex-presidente de duas instituições adventistas de educação superior. Traduzido e adaptado do original em inglês por André Kanasiro para a revista Zelota.
Como nasceu este livro?
No final de semana do dia 22 de outubro de 2023, uma conferência incomum foi realizada no campus do Pacific Union College. O termo “secreta” não seria o ideal, embora não houvesse anúncio público e tampouco espectadores. O tema para a pequena reunião foi “Ellen White para hoje”. Longe de ser artificialmente “diversa”, a conferência era composta em sua maioria de “obreiros idosos”, como descreveu um observador. Só havia uma participante na faixa dos trinta anos de idade. O grupo se uniu pela amizade e por suas reflexões de muitos anos a respeito de Ellen White. (Meia dúzia dos participantes do sul da Califórnia há anos vinham se reunindo quase toda semana para compartilhar suas pesquisas acadêmicas.) A conferência incluiu cinco ex-presidentes de faculdades e universidades, assim como muitos professores e pesquisadores com muita experiência em história eclesiástica. Na era do YouTube, nenhuma apresentação foi gravada.
A conferência foi construída em torno de uma perspectiva compartilhada — ou uma simples intuição. Todos os participantes acreditavam que a denominação adventista do sétimo dia está em um momento decisivo. A publicação tardia da pesquisa de Donald R. McAdams sobre O grande conflito oferecia, pensamos, uma chance de seguir em uma nova direção. Já não podíamos continuar discutindo sobre o que “não é assim, não”. Era hora de passar da demolição de falsas ideias para o reconhecimento das verdadeiras. No final da nossa análise, o que pudemos afirmar?
Na época de Ellen White, a maior parte das pessoas com alguma formação reconhecia o adágio em latim abusus non tollit usum — “O mau uso não anula o uso correto.” Os participantes da conferência aceitavam que as pesquisas acadêmicas críticas dos últimos cinquenta anos estabeleceram como Ellen White não deve ser usada. Graças a acadêmicos assíduos, alguns dos quais pagaram caro por suas descobertas, agora sabemos o que não devemos alegar a respeito da profetisa adventista.
Em meio à longa lista de negativas, sabemos que Ellen White não foi única, nem infalível. Ela não passou incólume por seu contexto histórico. Ela não é a autoridade final para toda e qualquer interpretação bíblica. Ela nem sempre foi original, e frequentemente tomava palavras e ideias de outros escritores, homens e mulheres que não reivindicavam inspiração divina. Ela partia do pressuposto de que muitas (mas não todas) ideias dos metodistas e batistas de sua época estavam corretas, como devaneios a respeito da idade da Terra. Até mesmo sua visão apocalíptica tinha raízes em seu próprio tempo. Embora criticasse o espiritualismo, o protestantismo apostatado e o catolicismo imutável, ela não descreveu os “movimentos finais” da história da Terra em uma linguagem que incluísse o comunismo, o islamismo militante, a crise ambiental, ou uma China imperial ressurgente. Ela não previu uma onda incessante de secularismo engolindo boa parte do mundo, inclusive a terra natal da Reforma Protestante.
Se tudo isso é verdade — e os participantes da conferência não disputaram essas conclusões — essas negativas dão uma imagem muito incompleta. Algo mais era necessário para captar o espírito da profetisa. Usos abusivos não dispensavam usos apropriados, razoáveis, e até inspiradores de seus textos. A conferência do dia 22 de outubro estava pronta para aceitar a validez de tais trabalhos de contextualização crítica e seguir adiante, rumo ao trabalho positivo de contribuir para com um consenso denominacional a respeito do uso apropriado dos escritos e do ministério dessa mulher notável.
Devemos muito a Ellen White para ignorá-la ou nos unirmos às vozes furiosas que a chamam de “fraude”. Suas conquistas são muito mais importantes que suas imperfeições — ou os exageros de alguns de seus seguidores.
Ela foi uma construtora de instituições muito proficiente, desempenhando um papel essencial na criação de colégios, hospitais e organizações da IASD. Ela foi uma escritora inspiradora, capaz de motivar mudanças dramáticas e sacrifícios impressionantes nas vidas dos crentes. Durante sua longa vida, ela frequentemente desafiava “irmãos de experiência” irredutíveis, podando os adventistas para longe de posições sectárias ou heterodoxas e rumo a compreensões cristãs ortodoxas de expiação, Trindade, e o poder transformador do amor de Deus. Moldada por muitas fontes, ela escreveu uma literatura devocional que descreve com grande apelo a atratividade da vida em santidade e do serviço cristão. De fato, muitos na conferência podiam testemunhar a respeito do poder dramático que as palavras dela tiveram em suas próprias vidas. “Caminho a Cristo motivou minha conversão,” disse um. “Eu sou adventista hoje porque li O grande conflito,” testemunhou outro acadêmico.
O livro que você tem em suas mãos se baseia nas apresentações, nos questionamentos e nos debates da conferência “Ellen White para hoje”. Finalmente há espectadores. Cada autor lida de alguma forma com a pergunta “O que ela pode nos ensinar hoje?” Acreditamos que encontrar uma resposta positiva para o “uso apropriado” desse dom providencial é a questão mais urgente diante do adventismo hoje. Nas páginas que se seguem, os leitores descobrirão o início de um trabalho de reconstrução. O objetivo é simples: resgatar nossa profetisa afirmando seus dons de forma honesta.
As conquistas de Ellen White
Sempre que penso em Ellen White, eu me lembro do sarcasmo de um amigo. Embora seja um teólogo e esteja distante de um tradicionalista rígido, ele se cansou de um certo desequilíbrio irritante que detecta entre historiadores. Respondendo ao seu ex-professor Ronald Numbers, que via pouca coisa miraculosa ou sequer notável na profetisa adventista, meu amigo explodiu: “Vamos ouvir sobre o papel dela na criação da Universidade Loma Linda pelo menos na mesma proporção que ouvimos sobre os comentários isolados que ela fez sobre “vícios solitários” e insanidade!”
Em outras palavras, o primeiro panfleto de saúde de Ellen White, Um apelo para as mães, não é o ápice das ideias que ela tinha sobre saúde, e tampouco é o grande monumento deixado pelo seu ministério. Talvez seja o caso de avaliá-la pelo que ela escolheu enfatizar em sua obra mais madura de 1905, A ciência do bom viver.
Piadas — incluindo a do meu amigo — empregam hipérboles. Mas creio que ele tinha alguma razão. Discussões a respeito da vida e das conquistas de Ellen White são na maioria das vezes um combate em densa neblina, com um lado gastando sua energia para captar imperfeições e o outro lado recuando, passo a passo, sob extrema pressão.
Se queremos recuperar plenamente Ellen White como mulher, devemos começar nos lembrando de suas conquistas. Qual é o aspecto da estátua dela a cem metros de distância — sem olhar de perto as lascas, rachaduras, pichações ou fezes de pombo? Em outras palavras, precisamos de generalizações, mesmo sabendo que tais afirmações costumam exigir uma qualificação, correção, ou especificação. Às vezes é útil parar de contar as árvores para visualizar a floresta. De vez em quando precisamos inclusive perguntar: “Quem plantou esta floresta?” e “Como preservá-la?”
Os autores de Resgatando a profetisa frequentemente empregam o termo “profetisa” para descrever Ellen White. O objetivo não é mistificar os leitores ou ocultar seus pensamentos comuns e seu contexto histórico essencial. Usando uma linguagem leiga, não técnica, um profeta é uma pessoa que (no nome de Deus) persuade — um líder que muda o comportamento das pessoas. Chamar Ellen White de profetisa significa colocar nosso foco no que ela construiu. Relutante a receber tal crédito, ela insistiria que a todo momento ela foi motivada, ajustada e sustentada pelo poder de Deus. Ela protestaria, é claro, contra o título desta seção — “As conquistas de Ellen White”.
Porém, como seus herdeiros espirituais, precisamos pensar no que ela conquistou. Mesmo com um profeta, é necessário dar um passo atrás, perceber tendências de longo prazo, e dar algum crédito aos esforços humanos. Do contrário, nossas avaliações provavelmente serão distorcidas, desequilibradas pelas falhas, ou desfiguradas por alegações improváveis. “Ela era humana, afinal” não deve anular “Que coisas tem feito Deus” ou mesmo “Veja o progresso que foi feito aqui.”
Aqui estão cinco generalizações que serão sustentadas ou presumidas nos capítulos que se seguem:
- Ellen White conduziu o Movimento do Advento a partir do “fanatismo” rumo à ortodoxia cristã.
- Ellen White inspirou a criação de uma rede de colégios e instituições médicas comprometidas com a recriação e restauração.
- Ellen White ensinou seus seguidores a separar a vida em santidade do legalismo.
- Ellen White levou o adventismo a se tornar uma missão mundial que transcendeu suas raízes estadunidenses.
- Ellen White rejeitava discretamente alegações exageradas a respeito de si mesma.
Os autores deste livro abordam as conquistas de Ellen White em formas variadas. Terrie Aamodt nos conta coisas novas e velhas das quais podemos ter esquecido. A profetisa adventista foi uma mulher numa cultura com ideias muito claras a respeito do “trabalho das mulheres” e dos papéis apropriados para homens e mulheres. Ellen White remou contra uma forte maré, já que encorajava, repreendia e alertava. Ela transformou uma função maternal em algo profético.
Jonathan Butler explica por que não se une a críticos estridentes da “Irmã White”, prontos a expulsá-la da família adventista por suas imperfeições. Assim como aprendemos a viver com nossos parentes e seus defeitos, devemos enxergar que, se rejeitarmos a liderança de Ellen White no nosso passado, estaremos na verdade serrando de forma imprudente o galho metafórico em que estamos sentados.
Gil Valentine sabe que “o passado é um país estrangeiro” e nos ajuda a entender o idioma falado nele. Leitores atuais, incomodados com uma linguagem dura e inclemente, precisam entender uma cultura que enfatizava o “discurso claro”. O estilo e o temperamento de Ellen White podem ser desanimadores se exigirmos a abordagem calorosa e terapêutica valorizada nos EUA modernos. Mas isso seria tão irrealista quanto esperar que Isaías escrevesse em inglês.
Denis Fortin e Paul McGraw vão destacar fatos que deveriam ser óbvios, mas que em seu texto até parecem inéditos. Ellen White era uma pregadora e escritora devocional, chamando incansavelmente seu público ao comprometimento total (ou devoção) e ao serviço fiel. Ela foi bem-sucedida em estabelecer tanto a “bendita esperança” quanto o “ocupai-vos até que eu volte” — isto é, construindo escolas e hospitais e enviando missionários para os confins da terra. Ela não era uma analista intelectual ou o que hoje se chamaria de “intelectual pública”, oferecendo comentários profundos e conscientes sobre a “direção” teórica da História. Ela não era sequer uma teóloga sistemática. Seu tema, na verdade, era como viver nos tempos do fim.
Em meu capítulo, eu ofereço aos leitores um experimento mental. Para entendermos a conquista de Ellen White, imaginemos uma história adventista sem ela. Como nossa história teria se distorcido ou transformado de formas negativas se ela tivesse morrido muito antes de 1915? O objetivo é enxergar mais claramente como ela contribuiu para com a ascensão e o progresso do adventismo do sétimo dia. Como resultado do seu trabalho, a denominação passou de um recanto atrasado do cristianismo para as grandes correntes da ortodoxia. A profetisa nos levou para uma compreensão mais clara do trabalho do Filho de Deus e a promessa de seu retorno iminente.
George Knight e Don McAdams revisam as evidências surpreendentes de que Ellen White rejeitava regularmente opiniões igualando-a à Bíblia ou alegando que ela era inerrante. Se alegamos tantas coisas que ela não teria alegado, não deveríamos culpá-la. Ambos os autores veem a possibilidade de resgatar a profetisa esclarecendo afirmações inapropriadas e revisitando oportunidades perdidas. De fato, ambos acreditam que estamos novamente em um possível momento decisivo.
Ron Graybill e Larry Geraty refletem sobre as várias formas pelas quais os adventistas explicaram o ministério de Ellen White. Faz toda a diferença, dizem eles, se estamos tentando explicar nossos ensinamentos para um público cristão mais amplo ou se estamos falando para os nossos. Aplicar Ellen White aos dias de hoje exige uma linguagem mais clara que utilizada nos últimos anos.
Por fim, Niels-Erick Andreasen apresenta um posfácio com uma reflexão sobre as implicações de todos os capítulos em Resgatando a visão. Após anos de liderança na universidade mais importante da denominação, ele visualiza formas pelas quais a liderança dela pode moldar o futuro adventista — livre de algumas das principais distrações do século 19. Como pesquisador do Antigo Testamento, Andreasen nos lembra que aplicar documentos antigos a preocupações do presente nunca é simples.
Do início ao fim, os autores deste livro estão comprometidos com a preservação das conquistas da profetisa adventista. A seu próprio modo, cada acadêmico protesta contra abordagens que se recusam a responder questionamentos, ignoram problemas, ou desperdiçam um legado. Juntos, estão comprometidos com a reafirmação de um dom providencial.
Como ler este livro
Resgatando a profetisa responde quatro perguntas importantes:
- Quem foi Ellen White? Terrie Aamodt, Jonathan Butler e Gilbert Valentine oferecem respostas inovadoras a esta pergunta, chamando nossa atenção para evidências negligenciadas.
- Como devemos interpretar os seus escritos? Paul McGraw, Denis Fortin e Eric Anderson sugerem princípios práticos de interpretação para esta visionária do século 19.
- O que significa “acreditar” em Ellen White? George Knight, Donald McAdams, Larry Geraty e Ronald Graybill explicam como afirmar o dom dela sem exageros ou deturpações.
- Para onde vamos a partir daqui? Niels-Erick Andreasen reflete sobre como o adventismo do sétimo dia pode aplicar uma defesa honesta da nossa “Mãe Fundadora”.
Livros podem provocar discussões. Este busca inspirar um diálogo atencioso ao invés de uma gritaria veemente. Livros sobre Ellen White podem ser controversos, com alguns autores rejeitando-a como ladra e impostora, enquanto outros insistem que ela jamais cometeu erros. Nenhum destes extremos nos parece plausível.
Cada um dos autores tem pensado nas questões abordadas por este livro há muito tempo — em alguns casos há quase meio século. Eles já deram aulas sobre o ministério de Ellen White para cursos de graduação, pós-graduação e seminários; prepararam comentários bíblicos; escreveram estudos históricos acadêmicos; e pregaram sobre os temas de “inspiração” e “revelação”. Todos em algum momento rejeitaram a tentação de vilificar ou glorificar.
Todos os autores chamam de dom o que Ellen White fez. Ao mesmo tempo, nenhum deseja ignorar as complicações na história, especialmente a humanidade de quem recebeu este dom. Eles esperam que você leia com a mente aberta e um espírito de oração. Eles contam com leitores que querem aprender a partir das palavras e do exemplo desta mensageira do Senhor.
Quando você terminar, volte e leia por conta própria as palavras da profetisa. Pegue sua cópia de Caminho a Cristo, ou O desejado de todas as nações, ou A ciência do bom viver, e procure o poder que um dia impulsionou você ou as pessoas ao seu redor. Leia-a como se fosse a primeira vez.
Como escreveu Ellen White na crise após 1888, “A questão é ‘O que é a verdade?’” Ela escreveu de uma forma difícil de ignorar: “A verdade não é definida pela quantidade de anos em que tenho crido. Você deve levar seu credo à Bíblia e permitir que a luz da Bíblia defina seu credo, mostrando onde ele é insuficiente e onde está a dificuldade.”
É nesse espírito que te convidamos a ler este livro.
Enxergar Ellen White como um todo, na rica complexidade de sua peregrinação terrena, pode até lembrar alguns leitores de uma canção da época dela — palavras que captam como ela via o mundo:
“Pois Jesus, nosso rei, em breve
Voltará rei dos reis, senhor;
Virá seu reino de luz fundar,
Um reino de paz e amor.”
A Zelota está traduzindo o livro para disponibilizá-lo gratuitamente em português e aceita voluntários para agilizar a tradução. Caso tenha interesse em participar, inscreva-se aqui.





