Existem, ao menos, sete fatos que todo adventista precisa conhecer sobre a questão da ordenação feminina para fomentar o debate e evitar a desinformação


Por Gary Patterson | serviu como secretário de campo da Associação Geral, assistente do presidente da Divisão Norte-Americana, presidente de algumas Associações locais e pastor de várias grandes igrejas durante sua longa carreira como ministro ordenado da Igreja Adventista do Sétimo Dia. Como membro da Comissão Diretiva da Associação Geral por muitos anos, ele teve envolvimento direto no desenvolvimento de políticas e conhecimento em primeira mão das discussões. Artigo traduzido e adaptado por Jonathan Monteiro do original em inglês para a revista Zelota.

Pranitha Fielder fala na igreja adventista em Potomac (Fonte: Potomac Conference of Seventh-day Adventists).

Em preparação para a próxima Assembleia da Associação Geral (AG), é importante que tenhamos os fatos corretos:1

Fato #1 – A ordenação não é uma questão bíblica.

Fato #2 – A ordenação de mulheres para o ministério não é e nunca foi proibida pela doutrina adventista do sétimo dia ou pela política da igreja.

Fato #3 – Ninguém violou a votação da Assembleia da Associação Geral de 2015 sobre a ordenação.

Fato #4 – O jogo de palavras tolo que está sendo jogado sobre ordenação e credenciais ministeriais comissionadas é desonesto e uma vergonha para a igreja.

Fato #5 – Os presidentes da União, por definição, devem agir de acordo com o voto de seu corpo constituinte, e não os ditames da administração da Associação Geral.

Fato #6 – As ações da Associação Geral para impor discriminação contra as mulheres em relação à ordenação ao ministério não estão em conformidade com a Crença Fundamental nº 14 e a General Conference Working Policy (GCWP) BA 60 05 e 10.

Fato #7 – A liderança masculina não é uma doutrina adventista do sétimo dia nem uma crença fundamental.

Dado o calor e a paixão, bem como viés, preconceito, desinformação e confusão que acompanharam a discussão sobre ordenação e obediência na Igreja Adventista do Sétimo Dia (IASD) por décadas, cabe à discussão abordar os fatos da questão para respondê-la honestamente. Parte do problema pode ser que a desinformação sobre o assunto tenha sido repassada por alguns que não conheciam os fatos. No entanto, muito mais grave é a disseminação intencional de desinformação na tentativa de manipular a discussão para chegar a um determinado fim. Se quisermos prosseguir com esta discussão para uma conclusão honesta e válida, precisamos abordar os fatos como eles são.

Fato #1  – A ordenação não é uma questão bíblica

Por mais estranho que isso possa parecer – dado o tempo e a intensidade com que a IASD abordou o assunto nas últimas décadas – a ordenação de ministros [independentemente de gênero] simplesmente não é uma questão bíblica. Demonstrando essa afirmação está o fato de que a palavra “ordenar” é uma palavra emprestada à língua inglesa, derivada do latim. Sendo este o caso, obviamente não ocorre nas línguas hebraica, aramaica e grega, que constituem as línguas originais da Bíblia.

É verdade que as palavras “ordain” e “ordained” ocorrem em traduções para o inglês. Mas seu uso em contextos sacerdotais não ocorre até centenas de anos após a Igreja do Novo Testamento, sob a influência do latim usado pela Igreja de Roma. E, além disso, as palavras ordain e ordained, encontradas em traduções para o inglês, têm vários usos e definições. Por exemplo, a King James Version (KJV), conforme listada em Youngs Analytical Concordance, usa essas duas palavras 35 vezes com vários significados, como nomear, colocar em ordem, estabelecer, arranjar, preparar, marcar etc. Além disso, esses 35 usos são derivados de 23 palavras originais gregas e hebraicas diferentes, nenhuma das quais, obviamente, é do latim.

Em geral, essas várias palavras são usadas no contexto de iniciar algo, ou atribuir alguém a uma posição ou responsabilidade, não as implicações sacerdotais que surgiram na igreja da Idade Média. Em vez de listar todos os 35 desses usos na KJV, os 12 a seguir fornecerão exemplos da variedade de questões, coisas e pessoas “ordenadas” pelo uso da palavra:

  • Holocaustos – Números 28.6
  • Festas – 1Reis 12.32
  • 212 atendentes do tabernáculo – 1Crônicas 9.22
  • Um lugar para Israel – 1Crônicas 17.9
  • Instrumentos musicais – 2Crônicas 29.27
  • Paz – Isaías 26.12
  • Lua e estrelas – Salmo 8.2
  • Um profeta – Salmo 81.5
  • Discípulos para pregar – Marcos 3.14
  • Crentes gentios – Atos 13.48
  • Anciões em toda igreja – Atos 14.23
  • Decisões dos anciões – Atos 16.4
  • Pessoas ímpias – Judas 4

Como demonstrado, o uso múltiplo do termo “ordenar” em traduções para o inglês – com seus vários significados e aplicações –, somado à falta da palavra latina como base de qualquer um deles, elimina a Escritura como fonte de informações sobre o significado da  ordenação ministerial na igreja hoje. E tentar usar as Escrituras para fazer isso demonstra hermenêutica desonesta e deturpação das Escrituras. Ela simplesmente não está lá.

Embora a igreja possa abordar a questão da ordenação pastoral se assim  desejar, isso deve ser feito no contexto em que o assunto se originou, a igreja da Idade Média. A noção da Igreja Romana de que o clero possuía um poder superior pertencente aos ordenados é a origem real da questão, não as Escrituras. Tal noção foi rejeitada pelos primeiros líderes adventistas, incluindo Ellen G. White, que declarou: “ligava-se a esse ato uma insustentável importância, como se acrescentasse um poder aos que recebiam essa ordenação, poder que os habilitaria imediatamente para toda e qualquer obra ministerial” (Atos dos Apóstolos, p. 110-111).

A ordenação nos primeiros dias da IASD ocorreu no contexto da autorização pela instituição para o ministério, não da superioridade sacerdotal. A necessidade de tal autorização e proteção da igreja tornou-se aparente na falta de líderes e pregadores da igreja, como observado por Ellen G. White: “Homens de pouca experiência que têm pouca influência, podem fazer sermões banais […] Não há nada nas palavras, ou no arranjo de ideias, que derreta e abra caminho para o coração […] Eles fazem um trabalho ruim” (Review and Herald, 5 de janeiro de 1869).

Novamente, 23 anos depois, em 1892, ela observa: “Há apenas uns poucos pregadores entre nós. E porque a causa de Deus parecia necessitar a ajuda de tanto auxílio, alguns foram levados a pensar que quase qualquer um que deseje ser pastor deve ser aceito. Certas pessoas acham que pela razão de uns poderem orar e exortar com certo grau de liberdade nas reuniões, acham-se qualificados para ser obreiros” (Testemunhos para a Igreja, p. 442-443).

As reuniões da igreja eram aparentemente um pouco desordenadas, com todos sentindo que tinham o direito de falar quando quisessem. Como J. N. Loughborough observou: “Em nossas assembleias, naqueles primeiros anos, quando não havia restrição sobre ninguém – quando alguém tinha tanto direito de ocupar [o púlpito] o tempo em nossas reuniões públicas quanto outro – ficávamos muito incomodados por homens de espírito turbulento” (Review and Herald, 9 de julho de 1901).

Foi neste contexto de autorização para proteger a igreja da discórdia que a ordenação foi seguida e que as credenciais ministeriais foram fornecidas, primeiro pela Associação local; após o estabelecimento das Uniões em 1901, essa autorização foi transferida para as Uniões, onde permanece até hoje.

Fato #2 – A ordenação de mulheres para o ministério não é e nunca foi proibida pela doutrina adventista do sétimo dia ou pela política da igreja

A autoridade da ordenação é claramente definida na política da Associação Geral (AG). Com relação à aprovação de pessoas designadas para ordenação, o regulamento B 05 afirma que “as decisões sobre a ordenação de ministros são confiadas à União-Associações” (General Conference Policy Working 2019-2020, p. 65). Depois de ter estabelecido essa autoridade, continua dizendo: “cada nível de organização exerce um domínio de autoridade e responsabilidade final”(p. 65). Assim, na seleção e autorização de tais indivíduos, a AG não tem autoridade sobre as decisões da União, desde que essas decisões estejam em harmonia com os critérios estabelecidos para ordenação pela política da AG.

Existem quinze desses critérios listados no regulamento  L 50, nenhum dos quais se refere ao gênero. Se, portanto, qualquer indivíduo aprovado pela União atender a esses critérios, a autoridade da AGl foi realizada. Dado que não há referência a gênero nesses quinze requisitos, a União está agindo dentro de sua autoridade para aprovar a ordenação conforme declarado na política B 05.

O Regulamento  exerce a governança final sobre a prática. Mas no caso de questões de gênero na ordenação, não há norma. No entanto, mais de um século de prática criou a percepção de que existe um regulamento sobre esse assunto, e cem anos de prática certamente estabelecem precedentes. Mas permanece que a política é a questão na ordenação, não prática, precedente ou percepção.

Uma vez que a ordenação é, pelo Regulamento da AG, de competência a nível de governança da União, a AG ultrapassou seus limites ao procurar dizer às Uniões que elas podem ou não ordenar mulheres ao ministério evangélico. Não está dentro da autoridade da AG tomar tal ação, da mesma forma que a ação relativa à membresia individual, a eleição de funcionários para os cargos da igreja, ou o emprego de pastores não é da alçada da AG. Essas ações pertencem às entidades constituintes às quais são atribuídas pela política, e não podem ser determinadas ou anuladas por outros níveis da estrutura da igreja.

Um exemplo desse exagero ocorreu em uma ação do Concílio de Primavera da Comissão Diretiva da AG, concedendo permissão às igrejas para ordenar mulheres ao cargo de anciã da igreja local. Dado que não existe nenhuma ação que proíba tal eleição ou ordenação de anciãs, ou qualquer outro ofício da igreja com base no gênero, portanto, não havia motivo para conceder tal permissão da AG. A eleição de oficiais da igreja está sob a autoridade do corpo constituinte da igreja local e, por regulamento, outras entidades não podem interferir neste processo.

A AG, União ou Associação local não pode, por exemplo, dizer à igreja local se pode eleger uma mulher como tesoureira ou secretária da igreja. Da mesma forma, eles também não têm autoridade para negar ou dar permissão para que mulheres sejam eleitas e ordenadas como anciãs. Elas podem dar conselhos e fazer sugestões sobre tais assuntos, mas não é de sua competência ditar quem pode ou não ser eleito. Sem nenhuma ação que proíba tais escolhas de gênero, a igreja não precisa de permissão para fazer o que achar melhor.

No início da história adventista, a AG tomou a seguinte ação:

  1. RESOLVIDO, que todos os candidatos à licença e ordenação devem ser examinados com referência à sua aptidão intelectual e espiritual para o cumprimento bem-sucedido dos deveres que recairão sobre eles como ministros licenciados e ordenados.
  2. RESOLVIDO, que mulheres em posse das qualificações necessárias para preencher essa posição podem, com perfeita propriedade, ser separadas por ordenação para a obra do ministério cristão” (Transcription of minutes of GC sessions from 1863 to 1888, p. 196).

A primeira resolução foi posta em prática, mas a segunda aparentemente não foi, embora nenhuma ação a rescindindo ou refutando tenha sido feita. Entretanto, em 1895, Ellen White parece tentar recomeçar essa ação, dizendo: “As mulheres que estão dispostas a consagrar parte de seu tempo ao serviço e ministrar às necessidades dos pobres. Elas devem ser separadas para este trabalho pela oração e imposição de mãos” (Review and Herald, 9 de julho de 1895). Novamente, em 1901, ela afirma: “É o acompanhamento do Espírito Santo de Deus que prepara obreiros, homens e mulheres, para se tornarem pastores do rebanho de Deus” (Review and Herald, 15 de janeiro de 1901).

Embora seja frequentemente argumentado e deturpado que as ações das Assembleias da Associação Geral de 1990 e 1995 proíbem a ordenação de mulheres, elas não o fazem. Ambas as moções de 1990 e 1995 foram para autorizar tal ordenação e, quando não foram aprovadas, simplesmente foram embora. A falha de uma moção para autorizar a ordenação não cria o resultado oposto de proibi-la. Em vez disso, permanece como era antes, sem ação.

Fato #3 – Ninguém violou a votação da Assembleia Geral de 2015 sobre a ordenação

O resultado da moção referente à ordenação na Assembleia Geral de 2015 foi deturpado por muitos, incluindo a liderança da AG. A votação foi para permitir ou não que as Divisões optassem por autorizar a ordenação de mulheres em seu próprio território. E após o fracasso dessa autorização, tem sido amplamente divulgado e percebido que a ação proíbe tal ordenação. Isso não é verdade. Após o fracasso desta autorização, o presidente da Associação Geral declarou que nada havia mudado. As coisas permanecem como antes.

Além disso, a alegação de que esta ação de 2015 foi violada é falsa. Nenhuma Divisão autorizou a ordenação de mulheres. Dado que a autorização para quem deve ser ordenado é, por regulamento, dada às Uniões, a moção na Assembléia  de 2015 para dar essa autorização às Divisões estava em desacordo com a política existente. É lamentável que essas ações sejam mal compreendidas. Mas muito mais grave é a sua deturpação intencional.

Se a AG deseja abordar a questão do gênero na ordenação ao ministério, poderá fazê-la alterando sua política existente para uma exigência direta de que a ordenação ao ministério seja exclusiva ao gênero masculino, proibindo assim a ordenação de mulheres. Não existe tal regulamento atualmente, nem nunca houve na história da igreja. Prática, precedente, percepção e até preconceito não constituem um dispositivo normativo. Apenas declarações políticas diretas e claramente articuladas governam a questão da ordenação inclusiva de gênero.

Fato #4 – O jogo de palavras tolo que está sendo jogado entre a ordenação e as credenciais ministeriais comissionadas é desonesto e uma vergonha para a igreja

A autorização para ordenar mulheres como anciãs/anciãos, diaconisas/diáconos, concomitante a uma recusa em ordenar mulheres como ministras, é totalmente sem respaldo bíblico. Fazer uma distinção entre essas diferentes posições ordenadas é arbitrário e não-bíblico. As mulheres no ministério, desde 1881, receberam uma licença ministerial, mas não foram ordenadas, uma prática que continuou por mais de 100 anos, até ser revogada em 1975.

Por mais estranho que possa parecer, essa mudança envolveu um conflito com o Internal Revenue Service (IRS, sigla em inglês) dos Estados Unidos durante a década de 1960, que coloca o clero na categoria de “autônomo”, liberando assim a igreja de pagar uma parte de sua Previdência Social e Impostos do Medicare e exigindo que o ministro pague esses impostos por conta própria. O IRS alegou que, a menos que os ministros desempenhassem todas as mesmas funções ministeriais, aqueles que não estavam autorizados a fazê-lo – precisamente os não ordenados – eram considerados funcionários da denominação em vez de autônomos. Essa luta com o IRS continuou por anos, até que ficou claro que a igreja deveria possivelmente milhões de dólares em impostos atrasados ​​e sofreria apreensões de propriedades por violar esses requisitos. A questão com o IRS era sobre deveres e funções, não títulos.

Foi nesse cenário que se decidiu conceder as funções do ministério, como realizar batismos, cerimônias de casamento etc., a ministros não ordenados, tanto homens quanto mulheres. Isso, no entanto, complicou as questões sobre quais credenciais e títulos deveriam ser concedidos aos ministros. Assim, decidiu-se criar uma nova credencial chamada credentialed commissioned ministers para ser entregue às mulheres no ministério. Foi votado conceder as funções de ministro ordenado a ministra e ministro comissionado, fazendo as pazes com o IRS e preservando as restrições prejudiciais à ordenação. Uma história tão espalhafatosa dessas credenciais rebaixa todo o processo de ordenação.

Fato #5 – Os presidentes das Uniões são obrigados a agir em conformidade com a Constituição da União e o voto de seu corpo constituinte e Comissão e Diretiva, não os ditames da administração da AG

No Concílio Anual de 2019 da Comissão Diretiva da AG, foram tomadas medidas para alertar os Presidentes da União Columbia e União Pacífico de que seus campos estavam sendo acusados ​​de descumprimento em relação à votação de 2015 da Assembleia Geral sobre permissão para Divisões permitir a ordenação de mulheres. Mesmo que esta acusação seja demonstrada como falsa no Fato 3 acima, esta acusação está ainda mais fora de ordem, dado que os presidentes da União são responsáveis ​​perante o Corpo Constituinte da União, e não servem à liderança da AG. Para entender a responsabilidade dos presidentes das uniões, é importante saber como funciona a estrutura da denominação adventista do sétimo dia e de onde deriva sua autoridade institucional.

Existem quatro documentos principais que governam a igreja e quatro corpos constituintes em sua estrutura. Os quatro documentos são as Crenças Fundamentais, a Constituição e os Regulamentos Eclesiásticos-Administrativos (REA) , o Manual da Igreja e a Working Policy da AG. Os quatro corpos constituintes são a Igreja local, a Associação local, a União-Associação e a AG. As Divisões não são organizações constituintes, mas sim segmentos da AG, fornecendo liderança e direção em territórios geográficos definidos.

As Crenças Fundamentais, a Constituição e REA, e o Manual da Igreja são determinados e modificados por votação da AG em Assembleia. A Working Policy da AG é determinada e modificada pelo voto do Concílio Anual da Comissão Diretiva da AG.

Os quatro corpos constituintes têm autoridade sobre funções específicas da igreja que pertencem apenas a eles e não podem ser tomadas ou combatidas pelos outros grupos constituintes. A igreja local é o único grupo constituinte que pode agir em relação a questões de membresia, eleição de oficiais da igreja, nomeação e ordenação de anciãs/anciãos, diaconisas/diáconos, orçamentos e finanças da igreja local e outras funções da igreja local. A Associação local é o único nível constituinte que pode agir em relação à irmandade das igrejas, seus funcionários, instituições e finanças.

Também vota para recomendar indivíduos para ordenação ao ministério evangélico, passando esta recomendação para a União-Associação. Mas ela não tem o poder de autorizar tal ordenação. Essa autoridade é da União. Como exceção a esta autoridade de ordenação, a Divisão e a Associação Geral podem autorizar a ordenação de seus próprios funcionários, mas não têm autoridade sobre aqueles votados para a ordenação pela União.

A ordenação é, pelo regulamento da AG, prerrogativa da governança da União. Sendo este o caso, a AG ultrapassou seus limites ao tentar dizer às Uniões que elas podem ou não ordenar mulheres ao ministério evangélico, dado que existe ação ou política que o proíbe. Não está dentro da autoridade da AG tomar tal ação, da mesma forma que as ações relativas à membresia individual, a eleição de funcionários para os escritórios da igreja ou funcionários da Associação local e a irmandade das igrejas. Tais questões não são da alçada da AG.

Essas ações pertencem ao corpo constituinte ao qual são designadas pela política e não podem ser determinadas ou anuladas por outros grupos na estrutura da igreja. Conforme declarado na política B 05 acima, “cada nível de organização exerce uma esfera de autoridade e responsabilidade final” nos assuntos que lhes são atribuídos pelo regulamento. Assim, a tentativa de forçar os presidentes a agirem em desacordo com o voto de seu corpo constituinte em relação à ordenação de mulheres – que, aliás, é consistente com a política – viola a estrutura básica da igreja na tentativa de torná-la uma autoridade de cima para baixo. Ela não é uma organização de cima para baixo. É composta por quatro corpos constituintes distintos, cabendo àqueles que trabalham para e nesses corpos agir de acordo com a vontade e a ação desses grupos.

Fato #6 – As ações da Associação Geral para impor discriminação contra as mulheres em relação à ordenação ao ministério não estão em conformidade com a Crença Fundamental nº 14 e o regulamento da AG nº BA 60 05 e 10

A Crença Fundamental nº 14, abordando a discriminação, é intitulada “Unidade no Corpo de Cristo” e diz o seguinte: “A igreja é um corpo com muitos membros, chamados de toda nação, tribo, língua e povo. Em Cristo somos uma nova criação. Distinções de raça, cultura e nacionalidade, e diferenças entre altos e baixos, ricos e pobres, homens e mulheres, não devem ser motivo de dissensões entre nós. Todos somos iguais em Cristo, o qual por um só Espírito nos uniu em comunhão com Ele e uns com os outros. Devemos servir e ser servidos sem parcialidade ou restrição. Mediante a revelação de Jesus Cristo nas Escrituras, partilhamos a mesma fé e esperança, e estendemos um só testemunho a todos. Essa unidade encontra sua fonte na unidade do Deus triúno, que nos adotou como seus filhos.”

Parece estranho que alguém possa professar acreditar e apoiar esta clara declaração de igualdade e ao mesmo tempo sustentar que as mulheres não podem ser ordenadas ao ministério. Pode-se imaginar o protesto e o alvoroço que resultaria se qualquer um dos outros grupos mencionados nesta declaração fosse excluído da ordenação com base em raça, cultura ou nacionalidade. E o mesmo alvoroço deve ser esperado sobre a exclusão das mulheres.

Mas se isso parece ser uma forte condenação de tal ação, considere a rigorosa declaração de política B 60 05 e 10: “A Igreja abomina qualquer sistema ou filosofia que discrimine alguém tendo como base raça, cor ou gênero. Essa posição se fundamenta nos princípios claramente enunciados na Bíblia, nos escritos de Ellen G. White e nos pronunciamentos oficiais da Associação Geral.”

Esta política não apenas declara claramente a rejeição da discriminação, mas é representada como sendo apoiada tanto pelas Escrituras quanto por Ellen G. White, deixando pouco espaço para discussão. Esta forte posição é continuada na seção seguinte, BA 60 10, que declara: “A Igreja mundial apoia a posição da não-discriminação em assuntos relativos ao emprego. Sustém o princípio de que deve ser concedida, tanto aos homens como às mulheres, total e igual oportunidade dentro da Igreja para desenvolver o conhecimento e as habilidades necessárias para edificar a Igreja, independentemente de sua raça ou cor.”

Até agora, o regulamento se mantém . Mas a próxima frase mina e contradiz a posição que foi claramente feita e apoiada com autoridade. Ele declara: “As posições de serviço e responsabilidade (exceto aquelas que exigem o requisito da ordenação ao ministério evangélico), em todos os níveis de atividade da Igreja, estão abertas a todos com base em suas qualificações individuais.”

Esta declaração tem sido representada por alguns como proibindo a ordenação de mulheres ao ministério evangélico. No entanto, não é uma política que proíbe a ordenação. Pelo contrário, é uma política que concede permissão para exercer discriminação contra certas classes de pessoas. É importante notar que a política não indica quem pode se enquadrar nessa categoria. Foi claramente declarado na política que “raça, cor ou gênero” são as questões abordadas, mas não diz quais dessas categorias podem ser afetadas por essa discriminação. Portanto, poderia ser igualmente aplicado a qualquer uma das três categorias, onde quer que tal discriminação esteja sendo praticada.

A premissa subjacente da política é conceder permissão para discriminar. Assim, o ônus recai sobre aqueles que procuram discriminar em seu território, não sobre aqueles que não o fazem, cabendo-lhes proceder em harmonia com a política, como se lê: “A Igreja mundial apoia a posição da não-discriminação em assuntos relativos ao emprego. Sustém o princípio de que deve ser concedida, tanto aos homens como às mulheres, total e igual oportunidade dentro da Igreja para desenvolver o conhecimento e as habilidades necessárias para edificar a Igreja.”

Além disso, a parte do regulamento que permite a discriminação é prejudicada pelo estabelecimento de credenciais ministeriais comissionadas, o que torna nula a afirmação de que a ordenação é “exigida” para realizar o ministério evangélico. Tendo se vendido à pressão do IRS, como demonstrado no Fato 4, essa desculpa para discriminação contra a ordenação de mulheres cai na categoria do jogo de palavras bobo da distinção entre ordenação e comissionamento. Se, de fato, as funções do ministério são concedidas e desempenhadas por ministros ordenados e comissionados, então a noção de uma posição “exigindo ordenação para o ministério evangélico” é destruída, pois essa distinção não existe mais. Como diz o antigo ditado: “Que teia emaranhada tecemos, quando primeiro praticamos para enganar”.

Fato #7 – A liderança masculina não é uma doutrina adventista do sétimo dia nem uma crença fundamental

Sustentar uma posição de que as mulheres não podem ter autoridade sobre os homens é incompreensível em uma igreja que tem uma mulher como uma de suas fundadoras primárias, e a vê como uma autoridade maior. A ginástica mental e teológica distorcida necessária para manter uma dicotomia tão torturada e contraditória é, na melhor das hipóteses, intrigante, se não intelectualmente desonesta, demonstrando um processo hermenêutico fracassado projetado para perpetuar o preconceito, em vez de descobrir a verdade. A verdade não é derivada movendo-se de textos específicos para posições rígidas. Em vez disso, a verdade é encontrada movendo-se da direção geral das Escrituras para a interpretação de detalhes.

Ao abordar a questão da liderança masculina, é bom começar do início – a narrativa da criação. O ponto fundamental da noção de liderança masculina é construído na ordem da criação com a ideia de que Adão foi criado antes de Eva. Portanto, ele tem primazia e superioridade sobre ela. No entanto, essa noção é repleta de dificuldades, sendo a primeira que no sexto dia da criação, os animais foram criados antes da humanidade e do mesmo material – o pó da terra. Assim, Adão não é o primeiro criado naquele dia, mas o segundo – ou ainda mais adiante, dependendo de quantos animais são contados.

Também pode ser postulado que o último ser criado foi o ato culminante da criação, após o qual Deus descansou de sua atividade criativa, tendo atingido seu auge. E, claro, seria Eva, não Adão, que não foi criado nem em primeiro nem em último naquele dia. Tal especulação é irrelevante, no entanto, dado que a narrativa da criação não dá crédito a nenhuma linha de raciocínio, mas diz que Deus criou Adão e Eva à sua própria imagem, nenhum sendo superior ao outro.

Ao expor esta narrativa da criação, Ellen G. White afirma claramente que Adão e Eva eram iguais em todos os aspectos: “Entre todas as criaturas que Deus fez sobre a Terra, não havia uma igual ao homem. E disse “Deus: Não é bom que o homem esteja só: far-lhe-ei uma adjutora que esteja como diante dele”. Gênesis 2:18. O homem não foi feito para habitar na solidão; ele deveria ser um ente social. Sem companhia, as belas cenas e deleitosas ocupações do Éden teriam deixado de proporcionar perfeita felicidade. Mesmo a comunhão com os anjos não poderia satisfazer seu desejo de simpatia e companhia. Ninguém havia da mesma natureza para amar e ser amado.

O próprio Deus deu a Adão uma companheira. Proveu-lhe uma “adjutora” — ajudadora esta que lhe correspondesse — a qual estava em condições de ser sua companheira, e que poderia ser um com ele, em amor e simpatia. Eva foi criada de uma costela tirada do lado de Adão, significando que não o deveria dominar, como a cabeça, nem ser pisada sob os pés como se fosse inferior, mas estar a seu lado como igual, e ser amada e protegida por ele. Como parte do homem, osso de seus ossos, e carne de sua carne, era ela o seu segundo eu, mostrando isto a íntima união e apego afetivo que deve existir nesta relação”” ( Patriarcas e Profetas , p. 20).

Não há espaço para um papel de liderança aqui, nem para Adão nem para Eva. Nenhum deve ser a cabeça ou estar debaixo dos pés do outro. Nenhum é superior ou inferior ao outro. Eles devem ficar lado a lado como iguais.

É óbvio que as Escrituras foram escritas em uma época de domínio masculino, e sua linguagem e comportamento refletem esse domínio. Mas antes de tomarmos um determinado comportamento bíblico como uma indicação de como a vida deve ser vivida, seria sábio aprender com o ditado “cuidado com o que você deseja”, pois a liderança masculina tem uma série de companheiros de comportamento estranho e espalhafatoso que detestaríamos apoiar.

Para começar, considere a escravidão. De fato, ela foi praticada ao longo da história bíblica e é reconhecida em nada menos que no quarto e no décimo mandamentos, que se referem a servos e servas. Além disso, Êxodo 21, seguindo os Dez Mandamentos, dá extensas regras para a propriedade e o tratamento de escravos/servos. E por mais difícil que seja para nós aceitarmos esse comportamento hoje, o Novo Testamento não nos ajuda muito com Paulo dizendo aos escravos para obedecerem a seus senhores (Cl 3.22) e aprovando a escravidão, que é o assunto da carta a Filemom.

Então considere a poligamia, uma prática praticada por ninguém menos que o patriarca Abraão (Gn 16.1-4). E para relacionamentos familiares de mau gosto, observe as múltiplas figuras maternas na genealogia dos filhos de Israel. Ou considere Salomão, que se diz ter tido 300 esposas e 700 concubinas, como se isso demonstrasse sua grandeza. E mais uma vez, o Novo Testamento não ajuda tanto quanto gostaríamos. Embora a prática da poligamia pareça ter diminuído nessa época, Paulo reconhece tacitamente sua existência em sua direção de que anciãos e diáconos devem ser “maridos de uma só mulher”, o que pressupõe que tal exigência não se aplica a outros na igreja.

Mas antes de ficarmos muito rígidos e julgadores sobre essa questão, lembre-se de que a poligamia, que é ilegal nos Estados Unidos, ainda é praticada por algumas religiões e é praticada regularmente em algumas partes do mundo. A complicação desta situação fez com que a Igreja Adventista na África abrisse uma exceção para que os convertidos mantivessem o apoio e a conexão para essas famílias, a fim de evitar que esposas e filhos se tornassem pobres e destituídos. No entanto, nada disso descarta a repugnância da prática.

Em puro comportamento corrupto, pouco se compara à história de Judá e Tamar, incluindo prostituição, engano, falha em prover descendência e exigir que até mesmo uma criança gere filhos com a viúva de um irmão mais velho, tudo em nome da continuação da linha genealógica (Gênesis 38). E o ponto da história não é a condenação do engano ou prostituição, paga por uma cabra, mas sim o fracasso de Judá em forçar o casamento de uma mulher com seu neto. Tudo isso é totalmente inaceitável na moralidade de hoje. No entanto, eles são comportamentos claramente registrados na Bíblia, e são considerados aceitáveis ​​entre os patriarcas.

Um conto mais repugnante de dominação masculina é a história de Ló oferecendo suas duas filhas para a multidão enlouquecida do lado de fora de sua porta (Gênesis 19.40), e suas ações incestuosas bêbadas destinadas a preservar a linhagem de herança depois de deixar Sodoma (Gênesis 20.30-36). Tal comportamento não é apenas reprovado hoje, mas considerado ilegal com grande punição. E a lista de comportamentos inaceitáveis ​​continua.

Considere o genocídio segundo a instrução do Senhor. “Disse-me, pois, o Senhor: Eis aqui, tenho começado a dar-te Seom e a sua terra; passa a desapossá-lo, para lhe ocupares o país. Então, Seom saiu-nos ao encontro, ele e todo o seu povo, à peleja em Jasa. E o Senhor, nosso Deus, no-lo entregou, e o derrotamos, a ele, e a seus filhos, e a todo o seu povo. Naquele tempo, tomamos todas as suas cidades e a cada uma destruímos com os seus homens, mulheres e crianças; não deixamos sobrevivente algum. Somente tomamos, por presa, o gado para nós e o despojo das cidades que tínhamos tomado.” (Dt 2.31-35; veja também 20.10-15)

Considere a segregação e o tribalismo (Nm 26.7-9). Considere, retribuição e execução – olho por olho e dente por dente (Êx 21–23). Considere a discriminação de gênero na exclusão do sacerdócio de todas as mulheres, sem falar no tribalismo que o torna aberto apenas aos levitas (Nm 3.5-10). Considere a execução por várias violações, incluindo adultério e violação do sábado (Êx 35.1-3; Lv20.10).

E a lista poderia continuar. Assim, fica claro que apenas porque um determinado comportamento é praticado nas Escrituras, mesmo com aparente aprovação em momentos específicos, ele está longe de ser uma validação desse comportamento como modelo para uma doutrina ou política da igreja hoje. Tais práticas que não são apenas aceitas, mas realmente defendidas nos tempos bíblicos, não são necessariamente modelos para nosso comportamento. E a liderança masculina é uma delas, junto com esta lista de estranhos companheiros de cama.

A liderança masculina não é uma doutrina adventista do sétimo dia nem uma crença fundamental. No entanto, a igualdade de gênero é tanto uma Crença Fundamental quanto um regulamento da AG. É um princípio básico da vida cristã. “Dessarte, não pode haver judeu nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo Jesus. E, se sois de Cristo, também sois descendentes de Abraão e herdeiros segundo a promessa.” (Gl 3.28-29).

Notas:

1. N.E.: O artigo foi publicado em 29 de fevereiro de 2020.