Atualmente, sabe-se da existência de mulheres pastoras, da necessidade da ordenação feminina em geografias específicas, do silêncio do Espírito de Profecia e da Bíblia sobre o assunto; mas não se justifica, por parte da liderança, a negação do comissionamento feminino ao pastorado


Série: O problema da ordenação feminina (parte 2)

Por Hannele Ottschofski | finlandesa, serve à igreja adventista como escritora, educadora, editora, palestrante e tradutora. Texto traduzido e adaptado por André Kanasiro do original em inglês para a revista Zelota.

Ordenação de Jessica Schultka (União Norte-Alemã) (Foto: Alvin Masarira)

A discussão atual sobre a ordenação feminina vem acontecendo há mais de 50 anos. Muitos livros e artigos a favor e contra ela foram escritos, e várias comissões estudaram minuciosamente o que a Bíblia diz sobre a questão, o que foi realizado mais recentemente pela Comissão de Estudo de Teologia da Ordenação, ou TOSC.1

A Dra. Leona Running, professora de línguas antigas, escreveu uma carta aberta em agosto de 2012 ao presidente da Associação Geral, Ted Wilson, que havia feito as aulas de hebraico dela no Seminário Teológico.

Caro Pastor Ted:

Por favor, leia atentamente o livro de Atos, capítulos 2, 10–11, e 15. Em nossos dias, o Espírito Santo está levando nossa Igreja a dar passos avançados como ele fez no concílio de Atos 15.
Nas sociedades ocidentais não podemos mais tolerar a discriminação de gênero da Igreja. Preconceitos como esse e racismo deveriam ser superados na conversão se os convertidos pudessem ser ensinados por pessoas que os superaram. O Espírito Santo está agora dizendo à Igreja Adventista na América do Norte, Europa e Austrália para parar de enrolar e prosseguir para ordenar as pastoras chamadas, treinadas e eficazes, e acabar com esta discriminação não cristã. Caso contrário, perderemos toda a próxima geração e a chuva serôdia não poderá vir.
O assunto tem sido bem estudado há anos — The Welcome Table (1995) e o Women in Ministry (1998) do Seminário continham capítulos bem pesquisados ​​e de alta qualidade anos atrás. As igrejas ocidentais que estão prontas para seguir a direção do Espírito Santo mostrarão o caminho para as igrejas de outros países; elas não dividirão a Igreja — mas se você tentar impedir o que o Espírito Santo está levando a ser realizado, você dividirá a Igreja!
Pedro e Paulo tiveram que derrubar o muro entre judeus e gentios em seus dias (Gl 3.28). Em nossos dias, devemos derrubar os muros do racismo e da discriminação de gênero. Como lhe disse meses atrás, oro todos os dias para que Deus o ajude a ser um pastor e não um ditador. Espero que essa oração seja respondida.
Com os melhores cumprimentos, sua professora de hebraico, com quase 96 anos,

Leona G. Running
Professora emérita de Línguas Bíblicas, Ph.D. DHL
Seminário, Universidade Andrews

As mulheres podem servir como pastoras na Igreja Adventista do Sétimo Dia (IASD). A igreja reconheceu que Deus também chama as mulheres e lhes dá o seu Espírito. Elas receberam a mesma educação que seus colegas homens e são movidas pelo mesmo Espírito Santo. Elas trabalham, batizam e pregam com o mesmo zelo que seus colegas homens, mas recebem uma credencial diferente apenas porque são fisicamente diferentes. Às vezes é dito que as mulheres são basicamente autorizadas a fazer tudo o que seus colegas homens ordenados têm permissão para fazer. Isso deveria ser suficiente para eles. Elas deveriam estar satisfeitas com o comissionamento.

Comissionamento para mulheres e ordenação para homens — onde está a diferença? Uma vez que a ordenação é necessária para cargos de liderança mais elevados, recusar-se a tratar as mulheres igualmente nega-lhes o acesso à liderança. As mulheres podem trabalhar para a igreja, mas nunca poderão assumir uma posição de liderança enquanto as políticas institucionais ditarem que os líderes devem ser ordenados. Os regulamentos eclesiástico-administrativos da IASD não reivindicam inspiração divina em sua origem.

A Divisão Norte-Americana introduziu uma nova adição aos seus regulamentos no dia 7 de novembro de 2010. Ela agora afirma que um líder deve ser ordenado/comissionado.2 Adotar esta mudança na Working Policy da Associação Geral resolveria facilmente os problemas atuais relativos à ordenação. A imposição de mãos — seja esta chamada de ordenação ou comissionamento — é um sinal de que o Espírito Santo chamou e está operando através da pessoa em questão. O Espírito não depende do vocabulário usado, mas é derramado igualmente sobre todos. Enquanto Deus chamar e abençoar, a igreja não deve restringir o escopo de seu chamado.

A maior Associação dos EUA é a única Associação no mundo que tem uma mulher como presidenta.3 Sua ordenação e vocação não são reconhecidas pela Associação Geral. Em 27 de outubro de 2013, Sandra E. Roberts foi eleita presidenta da Associação Califórnia Sudeste, e foi reeleita pelos delegados com grande maioria no final de 2018, após seu primeiro mandato. No anuário oficial da IASD, esta Associação tem um espaço em branco onde a presidência da Associação deve ser mencionada. Ela não é credenciada nas reuniões oficiais da Associação Geral e nem deveria estar presente. Em tais reuniões, ela não tem direito de falar ou de votar. Ela não tem esses problemas na Divisão Norte-Americana.

O presidente da Associação Geral, Ted Wilson, que foi eleito em 2010, pediu que o presidente aposentado Jan Paulsen apresentasse um devocional na reunião da comissão executiva no dia 17 de abril de 2012. Paulsen aproveitou a oportunidade para abordar a questão da ordenação feminina. Ele lamentou não ter conseguido levar a igreja a uma solução durante seu mandato. Ele disse que a ordenação de mulheres deve ser vista como uma preocupação missiológica que precisa ser regulamentada de acordo com a cultura local. E acrescentou: “Nossos líderes na Califórnia não podem tomar essa decisão por seus colegas na África; e nossa igreja missionária muito bem-sucedida na América do Sul não pode falar pela Europa em dificuldades.”

A rejeição da ordenação feminina é justificada com a decisão da Assembleia Geral de 2015, em San Antonio. Antes desta reunião, uma comissão mundial sobre ordenação, a Comissão de Estudo de Teologia da Ordenação, foi formada. Durante dois anos, os melhores teólogos da IASD se reuniram regularmente para estudar a questão da ordenação. Eles chegaram à conclusão de que nem a Bíblia nem Ellen G. White comentam explicitamente sobre isso. A Bíblia não diferencia entre a imposição de mãos na bênção, comissionamento e ordenação. Na verdade, a ordenação nem é um termo bíblico. A forma como a ordenação é vista pela liderança da IASD é uma relíquia da divisão católica entre clericalismo e laicismo. A solução para o problema da ordenação é tão fácil: acabar com isso completamente e comissionar todos os ministros.

Muito dinheiro e energia foram investidos neste estudo, mas as recomendações da comissão foram simplesmente ignoradas na votação de San Antonio. Portanto, não é de admirar que a maioria dos delegados tenha se manifestado contra permitir que as Divisões da IASD resolvam os assuntos de acordo com suas próprias necessidades. Não se tratava de mulheres não serem ordenadas ou trabalharem como pastoras. Tratava-se simplesmente do fato de que Divisões individuais não podem tomar decisões de acordo com suas próprias necessidades neste assunto. 

A decepção foi grande, pois exatamente 20 anos antes um pedido aproximadamente idêntico havia falhado. E, no entanto, para muitos não há caminho de volta. É triste que os opositores da ordenação feminina abusem desse voto como uma rejeição das mulheres no ministério. Nada mudou. As pastoras não são ordenadas, mas a IASD não as afastou de seu ministério. No entanto, para uma mulher que trabalha de acordo com seu chamado por Deus, é difícil lidar com situações em que homens e mulheres lhe dizem: “Quando você pregar, não irei à sua igreja. As mulheres não devem ser pastoras.” Para muitas pastoras, tal discriminação é muito dolorosa. Portanto, ficamos felizes por qualquer mulher que corajosamente aceita o chamado de Deus para se preparar para o ministério.

Em nome da unidade, uma possível divisão na igreja agora é aceita como a “sacudidura”, e medidas punitivas são introduzidas para organizações consideradas rebeldes. Uma tempestade está se formando e a liderança tenta impor a uniformidade. Mas ela não é causada pela questão da ordenação feminina, e sim pela forma como o assunto é tratado pelos líderes da igreja.

Notas:

1. Comissão de Estudos de Teologia da Ordenação (2012-2014).

2. Em 7 de novembro de 2010, a Comissão Executiva da Divisão Norte-Americana acrescentou a palavra “comissionado” à expressão “deve ser um ministro ordenado”, para que fique “deve ser um ordenado/comissionado ministro”.

3.N.E.: Atualmente, não temos nenhuma presidenta, e a que está sendo referida no texto é Sandra E. Roberts, da Associação Califórnia Sudeste, que atuou até meados do ano passado. Vale destacar também que ela não foi “a única”, mas a primeira eleita através de votação. Houveram outras cinco presidentas antes dela em outros campos.