Mesmo com a primeira ordenação feminina em 1995, e o incentivo para a iniciativa independente das Uniões-Associações, as mulheres ainda precisam reclamar por suas posições, tornando-se uma multidão impossível de ser ignorada pela liderança


Por Lindsey Abston Painter | formadora de saúde mental que vive no norte da Califórnia. Apaixonada por feminismo, justiça social e ficção científica. É uma mãe orgulhosa, tem muitos gatos e um cachorro pateta. Artigo traduzido e adaptado por André Kanasiro do original em inglês para a revista Zelota.

Kimberly A Bulgin, primeira pastora ordenada da União Central Americana (Foto: Mid-American Union)

Cerca de 10 anos atrás, alguns dos líderes da igreja na América do Norte, depois de lutar por anos para obter a bênção da Associação Geral (AG) para ordenar mulheres em cada Divisão que desejasse fazê-la, perceberam que, na verdade, não precisavam da permissão da Assembleia Geral, e começaram a fazê-la por conta própria.

Há muito tempo estava escrito na política institucional que as Uniões-Associações decidem quem ordenar dentro de seu território. Esses líderes propuseram (e as assembleias de seus corpos constituintes concordaram) que, uma vez que cabe às Uniões-Associações individuais – não à Associação Geral – tomar decisões para a obra local, as Uniões-Associações poderiam permitir que as Associações locais desejosas para ordenar mulheres o fizessem.

Logo depois, ordenações de pastoras, capelãs e líderes da igreja ocorreram na União Columbia e na União Pacífico. O impulso se espalhou para a Europa, com líderes adotando suas próprias formas de protesto contra a proibição. Outras Uniões-Associações declararam sua intenção de seguir os passos de seus pares.

Neste texto, analisamos a história da ordenação de mulheres da nossa denominação, concentrando-nos especialmente nos últimos 10 anos. Celebramos a coragem daqueles que avançaram e perguntamos: O que vem a seguir?

Uma enxurrada de mulheres pregadoras

Muitos votos foram feitos na Igreja Adventista sobre a questão das mulheres como clero. O que mais me afetou foi em 2015, quando a Assembleia Geral votou que regiões individuais, ou Divisões, não podiam decidir ordenar mulheres. Foi um golpe enorme.

Quando alguns líderes corajosos da igreja disseram ousadamente que ordenariam mulheres de qualquer maneira, meu coração deu um pulo! Em breve, pensei, uma onda de mulheres estaria pastoreando igrejas com sucesso. Seu talento para o ministério não ficaria mais escondido! Afinal, nada faz sucesso como o sucesso. Em minha mente, imaginei centenas — até milhares — de mulheres servindo fielmente em igrejas em todo o mundo. Imaginei líderes mundiais adventistas encorajando e incentivando mulheres jovens ao ministério. Talvez eles ocasionalmente tivessem a coragem de designá-las para congregações céticas, e uma vez que suas igrejas vissem o talento, a energia e a sabedoria dessas mulheres, até o cético mais hesitante seria conquistado.

As meninas que crescem nas igrejas adventistas veriam a liderança modelada para elas, e os meninos cresceriam respeitando a liderança e a autoridade das mulheres. Eventualmente, com o sucesso óbvio das pastoras, mesmo a Associação Geral não seria mais capaz de negar que as mulheres são chamadas por Deus e merecem ser tratadas de acordo.

Esperando

Assim, esperei pacientemente pela enxurrada de mulheres ministras, defendidas por esses líderes que falaram com tanta autoridade. Mas onde está? Já se passaram 27 anos desde a votação para comissionar mulheres, que (embora não seja uma ordenação completa) deu às mulheres permissão para fazer virtualmente todo o trabalho pastoral. Já se passaram 10 anos desde que a União Columbia e a União Pacífico ordenaram alguma mulher.

O número de mulheres no ministério é difícil de contar, de acordo com Nerida Taylor Bates, presidenta da Associação de Mulheres Adventistas. A determinação de uma mulher ser ou não considerada pastora depende de quem está fazendo a reportagem. A estatística inclui colportoras, ou apenas aquelas que têm educação teológica superior? A pesquisa de Bates, apresentada em um artigo na Spectrum, mostra que, fora da China, cerca de 1.600 mulheres são relatadas como pastoras em todo o mundo; no entanto, esse número parece incluir capelãs, líderes do ministério infantil, administradoras e professoras. A contagem de pastoras para a América do Norte mostra 150 mulheres, mas se professoras e outras fossem adicionadas para tornar a estatística comparável, esse número subiria para 377 (cerca de 8%). Embora a China mostre o número impressionante de 3.176 pastoras, Bates duvida desse número, já que o último relatório é de 2015. (A denominação afirma ter aproximadamente 20.000 pastores de ambos os sexos em todo o mundo, mas esse número também pode estar em dúvida, dependendo de como se define “pastor”.)

Claramente, as mulheres ganharam terreno como ministras adventistas. Mas é uma enxurrada? Dado que as mulheres podem realizar todas as tarefas pastorais desde 1995, não creio que seja. Além da China, quando se tratava de designar pastoras para as congregações, a coragem dos líderes falhou – especialmente aqui na América do Norte, mas provavelmente em outros lugares também. As congregações que não tinham certeza de ter uma pastora não foram desafiadas a aceitar uma.

Embora vários programas tenham incentivado as mulheres a entrar no ministério, na ausência de reconhecimento total eles não tiveram muito sucesso. Aquelas que corajosamente escolheram estudar para o ministério mesmo assim costumam encontrar poucas oportunidades esperando por elas após a formatura, e embora muitas estejam frequentando o seminário, parece que poucas estão se tornando pastoras. Algumas mulheres no ministério trabalharam na obscuridade ou acabaram como capelãs de hospitais ou líderes de crianças.

Então, depois de todos esses anos, faço a mesma pergunta que Carmen Seibold fez em seu artigo sobre mulheres no ministério, na edição do inverno de 2019 da revista Adventist Today: “O que estamos esperando agora?”

Vamos supor que os líderes da igreja tenham começado em 1995, quando as mulheres foram comissionadas pela primeira vez (o precursor da ordenação) para ocupar cargos pastorais. Fazer progresso exigia mais do que palavras de apoio; os líderes precisavam pressionar a questão. Se as mulheres hoje representassem 25% do total de pastores nas regiões dispostas a ordenar mulheres, duvido que ainda precisaríamos discutir o assunto. Já seria óbvio que as mulheres estão aptas a liderar no ministério, e nossas igrejas teriam melhorado como resultado de suas habilidades e talentos. No entanto, aqui estamos. Ainda esperando.

Pastoras? Nada de novo

Mesmo na América Latina, as mulheres estavam na liderança da Igreja Adventista por um século antes de começarmos a retroceder. Eu vi os certificados de ordenação provando que Ellen G. White foi ordenada ao ministério. Os adventistas do sétimo dia começaram com uma mulher nos liderando. Por que pararíamos agora?

Alguns campos, embora apreciem Ellen G. White, têm resistido à ordenação de mulheres, citando fatores culturais. Vamos deixar claro que virtualmente toda a discussão em torno desta questão tem sido para permitir que os campos que desejam a ordenação avancem, não para forçá-la a ninguém. 

No meu mundo – representado pela América do Norte, grande parte da Europa, além da Austrália e Nova Zelândia – os cristãos esperam não apenas que as mulheres ministrem com credenciais iguais, mas creem que a igreja se beneficiaria muito disso. Como mulher, como posso continuar apoiando e frequentando uma igreja que deixou bem claro que não me apoia como igual aos meus irmãos em Cristo?

Pessoas da minha faixa etária e mais jovens (e algumas mais velhas!) estão deixando a igreja. A igualdade das mulheres não é a única razão para este êxodo em massa, mas faz parte dele. Boas intenções não são o bastante. É hora de mostrar a coragem de colocar pastoras em nossas igrejas.

Janela de oportunidade

Temos uma janela de oportunidade única. Pela primeira vez em meus quase 40 anos neste planeta, o poder e a influência da Associação Geral parecem estar diminuindo. Graças a decisões como as tomadas há 10 anos por Uniões-Associações na Costa Leste e Costa Oeste dos Estados Unidos, as decisões locais e regionais estão se tornando mais significativas para nossos membros. Essa é uma chance de seguir em frente. 

Não estou escrevendo isso para criticar nossos líderes ou para expressar amargura com a direção em que a Associação Geral vem conduzindo a igreja. Estou escrevendo para celebrar nossas pastoras. Para incentivá-las.

Também quero desafiar nossa igreja a ser mais ousada. Seguir o caminho lento e “não fazer ondas” significa que as pessoas jovens e educadas que dizemos que queremos manter estão percebendo que seus valores não se alinham com os valores da igreja. Queremos continuar perdendo membros?

Cremos que as mulheres são iguais aos homens, igualmente chamadas por Deus para o ministério? Provem. Coloquem pastoras nas igrejas agora mesmo. Recrutem e incentivem agressivamente as mulheres para o ministério. Estabeleça uma estrutura organizacional para apoiá-las e incentivá-las. Não deixem que igrejas relutantes ou vozes anti-mulher nos impeçam.

Preparando a próxima geração 

Recentemente ouvi uma história que me emocionou. Minha amiga viu uma pregadora pela primeira vez quando tinha cerca de 30 anos. Ela conta como ficou emocionada na primeira vez em que ouviu uma mulher pregando um sermão poderoso do púlpito. A experiência mudou sua vida – da maneira mais literal. Ela foi tão afetada por isso que voltou ao seminário na meia-idade para se preparar para o ministério! Ela agora é uma das mulheres ordenadas da União Columbia.

O valor de ver a representação feminina na liderança pastoral não pode ser subestimado. Agora mesmo, Deus está chamando menininhas que estão sentadas nos bancos, mas que tiram isso de suas mentes porque veem apenas homens no púlpito. Que tragédia! Não vamos deixar que as pessoas mais conservadoras da denominação se tornem o padrão pelo qual toda a igreja deve viver, ou, no processo, extinguiremos o fogo para o resto de nós. Esse é o caminho da morte para a igreja. Temos líderes que acreditam na igualdade das mulheres. Na versão cinematográfica de uma das minhas séries de fantasia favoritas, O Senhor dos Anéis, o filho de um rei é exortado a “mostrar sua qualidade”. Agora é a hora de nossos líderes nos mostrarem sua qualidade. A enxurrada de pastoras ainda pode começar. Nós estamos esperando.