Na Divisão Sul-Americana, onde os números de batismos evidenciam narrativas de sucesso, imigrantes hispânicos desafiam o evangelismo tradicional e expandem comunidade por meio de suporte mútuo
Na manhã de sábado do dia 12 de outubro — na abertura da escola sabatina do Concílio Anual da Associação Geral (AG) em 2024 — Edward Heidinger, secretário executivo da Divisão Sul-Americana (DSA), compartilhou sua perspectiva a respeito do sucesso missionário das escolas sabatinas em sua região. Ele explicou que, desde o Fórum Sul-Americano de Escola Sabatina, realizado em maio de 2024 na sede da DSA em Brasília, uma estratégia foi implementada para transformar classes de escola sabatina em unidades missionárias ativas.
Como propaganda, Heidinger destacou o caso de uma classe de escola sabatina da Igreja Universitária em Engenheiro Coelho, SP, que adotou a estratégia em 2023 e batizou nove pessoas no ano seguinte, crescendo o bastante para se tornar uma nova igreja. Ele não ofereceu maiores detalhes, mas avaliou o sucesso do projeto pelo número de batismos, de modo similar à apresentação da iniciativa em outros casos.
A “igreja” em questão, no entanto, é um grupo hispânico que se organizou para facilitar a comunicação e o suporte a imigrantes que chegam ao Centro Universitário Adventista de São Paulo (UNASP), campus Engenheiro Coelho, seja para estudar ou buscar melhores condições de vida — muitos dos quais são frequentemente ignorados pelo governo local e pela IASD na região.
Em busca de um salão maior
Em conversas pessoais, os líderes desta comunidade hispana explicaram que o grupo começou a se organizar em uma classe de escola sabatina na Igreja da Cidade Universitária em Engenheiro Coelho, em dezembro de 2022. Ela era conduzida pelo venezuelano José Luis Medrano Romero, e atraía cerca de 10-15 participantes todos os sábados. Inicialmente, seu objetivo era simplesmente facilitar as discussões da lição da escola sabatina para falantes de espanhol, mas ela gradualmente começou a atrair imigrantes adventistas das redondezas.
Na época, o pastor Jair Júnior Miranda, diretor do Ministério Pessoal e da Ação Solidária Adventista (ASA) na Associação Paulista Central (APAC), estava promovendo o projeto “Escola Sabatina Viva”, que visava transformar classes de escola sabatina em unidades de ação missionária. A classe hispana viu neste movimento uma oportunidade de se expandir, reunindo-se em pequenos grupos aos domingos nas casas dos membros. A decisão de se organizar foi uma iniciativa da própria classe.
As reuniões de domingo logo atraíram um número considerável de imigrantes, atingindo 30-40 participantes. Com este crescimento, o pastor distrital Luiz Charles Moreira e o teologando Lindenberg Barbosa, juntamente com a liderança da iniciativa, planejaram a criação de uma “igreja hispana” — a primeira do tipo na região metropolitana de Campinas. Barbosa notou que Miranda não esperava que o grupo chegasse a este ponto.
Após assegurar um salão para a igreja aspirante, os membros se mobilizaram para pintar e organizar o espaço. Em outubro de 2023, a comunidade foi reconhecida oficialmente como “grupo”, e agora busca atingir a categoria de “igreja”. O salão atual tem sido usado há três meses e comporta cerca de 50 pessoas, mas já acomoda mais de 70 aos sábados. A liderança está em busca de uma construção ou terreno maior para construir uma nova congregação.
“Somos todos estrangeiros”
De origens diversas, a comunidade inclui, segundo estimativas da liderança, mexicanos, venezuelanos, peruanos, colombianos, bolivianos, nicaraguenses e outros — alguns dos quais são imigrantes adventistas buscando formação educacional ou melhores condições de vida. Venezuelanos — que compõem cerca de 20% do grupo — formam o maior contingente, primariamente em busca de lugares melhores para viver.
A atmosfera em meio aos membros é calorosa, de simpatia e apoio mútuo. Os imigrantes vão à comunidade para interagir e adorar em seu idioma nativo, preparar pratos tradicionais de sua cultura, e buscar assistência quando necessário. De acordo com Barbosa, “eles [os imigrantes] chegam desesperados”. Ele explica que a igreja se tornou um ponto chave de referência para estrangeiros angustiados.
A liderança do grupo hispano acredita que o crescimento da comunidade é devido aos seus esforços para reunir e auxiliar uma população que antes era negligenciada. Ranielle Macedo, que foi candidata a vereadora em Engenheiro Coelho pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), nota que faltam ao governo local iniciativas para auxiliar imigrantes. Mas, em contraste, ela também relata que sentimentos racistas e xenofóbicos são prevalentes em encontros políticos, o que resulta na recusa de empregos a imigrantes recém-chegados.
Faz alguns anos que o UNASP atrai muitos imigrantes adventistas de países latino-americanos e africanos lusófonos a regiões que não atraem muita atenção de estrangeiros, como a pequena cidade de Engenheiro Coelho e os bairros mais pobres ao redor do campus de São Paulo.
De acordo com Domingos Selembe, diretor de atividades culturais para alunos estrangeiros no campus, a universidade também não tem projetos específicos para tratar das necessidades de imigrantes na região. Só há esforços não oficiais e indiretos que visam apoiar os estudantes, como bolsas, colportagem, e a iniciativa “Adote um aluno” — em benefício tanto de alunos brasileiros quanto internacionais.
Selembe afirmou que, embora não esteja familiarizado com a realidade de imigrantes fora do campus, a maior parte dos alunos migrantes no UNASP são bolivianos e peruanos. Para os que estão vivendo perto da universidade, as únicas entidades que oferecem assistência a este grupo, através da mediação do grupo hispânico crescente, são a ASA e a Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais (ADRA).
O campo de missão hispânico
O Documento do Fórum de Escolas Sabatinas — votado no Fórum de 2024 — estabeleceu o objetivo de “implementar o plano global de TMI [Envolvimento Total de Membros] em cada classe de escola sabatina (Pequenos Grupos)” para preparar candidatos ao batismo durante a “colheita” da Semana Santa em 2025, chamada Marcas de Cristo. O objetivo é que cada uma das 100.000 classes de escola sabatina conduzam quatro estudos bíblicos, com o objetivo de batizar pelo menos 70.000 “discípulos”.
Este objetivo não leva em consideração as necessidades da comunidade hispânica em Engenheiro Coelho e ignora a missão do grupo de auxiliar imigrantes. As diretrizes do documento também não consideram as dificuldades sociais dentro do bairro, avaliando o sucesso da missão somente pelo número de batismos. A liderança hispânica, no entanto, está ciente de sua função singular, e assume a responsabilidade para alcançar tantos imigrantes dispersos quanto possível.
Além disso, líderes locais, civis e religiosos estimam que 80% da população da Cidade Universitária é adventista. De acordo com dados de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Engenheiro Coelho tem uma população de 19.566 habitantes, com 1.500 vivendo na Cidade Universitária — conforme reportado pela Sabesp. A União Central Brasileira (UCB) registra que igrejas nas redondezas reúnem mais de 700 membros batizados, não incluindo os que participam da igreja no UNASP, a qual tem 4.016 membros.
O grupo hispânico está localizado dentro de uma área “evangelizada”, em grande parte devido à influência das atividades do UNASP, onde a presença adventista molda a economia local. Por exemplo, comércios no bairro não funcionam aos sábados e não vendem álcool, cigarros ou café. Esta situação suscita questões sobre a validade de estabelecer alvos de batismo para grupos nesta região.
De acordo com José Luis, o grupo só batizou dois venezuelanos desde 2022. Barbosa também relatou que dois desbravadores foram batizados no dia 19 de outubro de 2024, mas eles não eram imigrantes. Esta informação contradiz o relato de Heidinger no concílio anual, que mencionou nove batismos em 2023. Mesmo dentro de uma região predominantemente adventista, a comunidade está atualmente conduzindo sete estudos bíblicos para imigrantes venezuelanos.
Ao omitir a verdadeira razão por trás do crescimento da comunidade hispana, Heidinger usa o caso como ferramenta promocional para os projetos da DSA, negligenciando os problemas sociais enfrentados por imigrantes.