Mesmo acusando a Teologia da Prosperidade de “religião commoditizada”, isto é, regida pela lei do capital, a teologia sugerida por Ed René Kivitz ainda expressa o espírito do capitalismo e se curva à idolatria do mercado


Por João Marcos Duarte | doutorando em Linguística (UFPB). Membro da Igreja Batista Água Branca (IBAB). Texto escrito originalmente em agosto de 2021.

Ed René Kivitz (Foto: Instagram / IBAB – Edição Revista Zelota)

“Toda teologia é uma teologia de classe”
René Padilha

Em um dos artigos fundantes da Teologia da Missão Integral, René Padilha nos põe diante da constatação de que não é possível fazer teologia prescindindo do chão da vida, que a vida no mundo em que vivemos é uma vida em uma sociedade de classes, donde a obviedade muitas vezes não percebida – por miopia, falta de vontade ou coisa pior, a depender de quem a nega – de que qualquer formulação a respeito de Deus tem uma origem nessa mesma classe social. No Brasil, essa formulação, desde meados dos anos 1980, fez muitas igrejas e ministérios que se opuseram em variados pontos à teologia sistemática então vigente, colocando suas limitações e pontuando os próximos passos a serem dados para que o reino de Deus viesse à terra, como Jesus nos ensinou a orar. Ainda está por ser escrita a história social dessa teologia, que tem muito a ver com o processo de redemocratização no mesmo período.

É desse mesmo modo que o pastor Ed René Kivitz começa sua fala, mas a partir da formulação de Otto Maduro, ao fazer uma crítica à teologia a partir da teologia para um público, a priori, à margem desse tipo de discussão, em certa ocasião no Café Filosófico, organizado pela CPFL. Nesse encontro, nosso teólogo teve mesa, água e tempo para expor seu pensamento, sua teologia. Na ocasião, ele estava numa curadoria sobre a relação entre religião e mercadoria. O título de sua palestra foi “Espiritualidade inconsistente: Deus como mercadoria”. Estamos diante de um teólogo exemplar1 da segunda geração dos formuladores da Teologia da Missão Integral (TMI) no Brasil.

Iniciando a exposição, após colocar que todo o ser humano é religioso e que essa é uma coisa inerente à condição humana, é dito que o ser humano é um ser agônico, sendo essa a gênese da experiência humana, a que a religião responde: se não podemos morrer sem saber porque vivemos, ela nos dá um sentido. Vale dizer que Kivitz arroga para si a genealogia dos teólogos que vai de Santo Agostinho a Kierkegaard. Nas palavras do teólogo: “viver não é sobreviver” e, assumida essa máxima, “como eu dou sentido e significado para a minha jornada aqui?” 

Já de início nos salta uma pulga atrás da orelha ou uma vozinha vinda de sei lá onde que nos interpela: para quem viver não é sobreviver? Vivemos num mundo cuja revolução são os movimentos migratórios e os totens são os campos de refugiados, vidas nuas que são mantidas com o mínimo para sobreviver (pão, água e certo tipo de atendimento médico), mas absolutamente nada além disso, permanecendo nesses lugares por tempo indeterminado e a perder de vista; ou, se quisermos algo mais próximo, na condição de país que vive na zona da fome, quem não sobrevive em nosso país? Poderia ser dito, em defesa do que já foi exposto, que se trata de um manifesto e cabe a nós fazê-lo cumprir. Continuemos.

Como vivíamos antes no estado de natureza, no dizer de Kivitz, a religião foi o primeiro meio de sociabilidade e de contenção, proteção contra os iguais que poderiam nos fazer mal, mas também uma primeira maneira de entender e conviver com as forças da natureza. É a partir dessa linha que vão se desenvolvendo as diferentes religiões e os diferentes povos, até que chegamos, através da evolução, ao monoteísmo das religiões abraâmicas (em primeiro lugar o judaísmo, depois o cristianismo e, mais recentemente, o islamismo) cujo Deus convida toda a humanidade “para a unidade apesar de toda a diversidade”. 

Há aqui algo interessante e cristalino: as religiões abraâmicas têm, de modo atávico, uma vocação para a totalidade. Poderíamos dizer, na linguagem empregada pelo teólogo, que essa vocação para a totalidade é “ontológica”. Isso significa que, por um lado, não são pontos fora da curva, senão a linha mesma, todos os desenvolvimentos do cristianismo e, por outro, que nesse tipo de experiência religiosa, a diferença é assimilada e amalgamada, incorporada. Toda a diferença deve estar em conexão com a Unidade. Não é preciso dizer que isso se dá através da conversão, que é feita pela profissão de fé do fiel recém-convertido com sua boca e depois com o batismo (Mc 16.16). Quando isso não acontece, existe outra solução, mas a deixemos para seu momento. Esse cristianismo, voltando a dar a palavra a Ed René Kivitz, vai se tornando hegemônico, e isso se torna claro com o fato de que “não precisamos ir muito longe para constatarmos que o Ocidente é hegemonicamente ou quase absolutamente cristão, ele é de construção cristã”, e que “quando nós falamos ‘deus’, aqui no Ocidente, nós estamos nos referindo ao Deus bíblico”.

É colocada na mesa a síntese paulina entre a religião de Israel, a filosofia grega e o direito romano, bem como o “chão de metafísica platônica” oferecido por Santo Agostinho e sua doutrina da Trindade. Seguimos com Constantino e chegamos na Reforma Protestante, a revolução alemã, segundo um de seus mais expressivos filósofos. Dando continuidade à sua historiografia das ideias, “quando se afirma a consciência do indivíduo, a liberdade de consciência individual” para se ter um relacionamento com a Trindade de maneira direta, sem a mediação da igreja e da religião estabelecida, chegamos à modernidade. Ou seja, para essa teologia, a modernidade começa não com Maquiavel ou com Descartes, mas com Lutero. A consciência nasce ali e, portanto, todos os movimentos modernos são resultado dessa primeira cisão desde dentro do cristianismo. Mais uma vez a totalidade: cristão ou ateu, todo moderno que acredita na razão e na consciência individual é legatário da Reforma Protestante.

O problema é que em determinado momento o jogo virou: a religião, principalmente após a Revolução Francesa, passa a ser classificada como superstição e como particular, onde nasce o indivíduo que escolhe no que quer acreditar. Aqui vale uma observação interessante: é daí que nascem o que hoje se chamam teorias da conspiração e que são tidas como devaneios, loucura ou falta do que fazer por uns e outros (observação nossa). Com a criação do indivíduo e a passagem da religião (cristã) do espaço público das relações sociais para o espaço privado das relações familiares e particulares, é gerada a “privatização da religião”. A igreja perde o monopólio da subjetividade, nas palavras de nosso pastor. A partir de agora, “o indivíduo vai escolher qual sua plataforma religiosa”, aí a religião se torna privatizada. Em outras palavras, o referido teólogo indica aqui o caminho que mais tarde será chamado de secularização, onde se perde a arena pública, mas “não perde força e a potência de interpelar consciências individuais”. Finalizando esse Elogio da Religião, a constatação de que a religião foi colocada no banco dos réus, “mas parece que ela não foi condenada”.

Para nosso teólogo, a religião não só não foi condenada, como não se contenta em conquistar mentes e corações e quer, a seu modo, já que proibida por lei de arbitrar no espaço público, invadir as relações sociais. Com isso ela passa a rivalizar com a saúde mental, os coaches, as ideologias, os Estados-nações, as estrelas – hoje em dia com seus coaches, suas ideologias, seus Estados-nações2 e suas próprias estrelas3. Justamente por fazer parte do mundo, se conforma a ele. No mundo do mercado, a religião se torna um mercado e uma mercadoria. Independentemente das razões de sua migração para o campo do mercado e da forma-empresa, ao fazer isso “a religião precisa ser vendável, ela precisa se vender, ela precisa ser atraente”; entra no mundo da competição (nada mais parecido com o novo espírito do capitalismo, com a nova razão do mundo, ambas, como vimos, de raiz cristã reformada).

Como tudo que é bom dura pouco, ao se dar conta de que a religião deixa de ser o ente totalizante e passa a ser o mercado – ao qual ela teve que se incorporar para não morrer – e onde “o indivíduo é o centro, onde as experiências estão privatizadas e é a consciência que indica o caminho espiritual”, o resultado é uma “religião a la carte”. Essa religião – porque para o teólogo exemplar, é a religião que move o mundo – faz surgir, por isso mesmo, uma nova antropologia em que “esse ser humano em agonia, em busca de sentido, se torna consumidor, ele olha para o mercado” e busca esperança e devoção a algo – alguém mais esperto diria que se trata de fetiche da mercadoria ou de “aura”, mas não vem ao caso. 

Assim sendo, é preciso se integrar a algum nicho, algum grupo que tenha relações mercadológicas parecidas com as suas, cujo princípio fundamental é a “relação custo-benefício”, a “funcionalidade”. Isso porque “agora eu sou o dono da minha opção de futuro, eu sou o construtor do sentido da minha existência”. Essa religião-mercado também aprende a lidar com esse indivíduo enquanto consumidor; “se ela está sendo consumida, ela aprende a tratar com o consumidor, ela faz marketing religioso, ela desenvolve linguagem”; e a lista continua, “ela desenvolve ícone, estrelas, ela constrói elementos para cativar o consumidor, mas a religião faz isso de um modo perverso, porque no campo religioso […] esse consumidor continua sendo um ser assustado, agônico, angustiado, amedrontado”. Tendo esse diagnóstico, “a religião acessa alguns lugares da alma humana para cativar e o cativar não é apenas conquistar, mas de tornar cativo, de escravizar”; a religião acessa a culpa e o senso de dívida. Poderíamos complementar, muito provavelmente com sua assunção, a respeito da religião de nosso tempo que é, ela mesma, uma religião da culpa e que tudo o que se faz, ao invés de expiar a culpa, a faz aumentar.

A grande questão é que no mundo cujo imperativo é o do mercado, é preciso se conformar a ele, e a religião competitiva no mercado é, nas palavras do teólogo, a “religião commoditizada”, que é aquela que, de um lado, vende bênçãos e, de outro, abre franquias. Ora, se não é outra maneira de voltar à Teologia da Prosperidade com outras palavras, mais grandiloquentes, no caso. Nas palavras do teólogo em questão, esse tipo de relação com a divindade reduz Deus a um ídolo. Outros ramos dessa mesma teologia vão colocar, além de Deus, a transformação de si mesmo em ídolo, pois não conseguem olhar para as pessoas que estão ao lado como seres humanos e corpos que importam – interessante perceber que a teologia que prima pela consciência, afinal é uma questão de consciência perceber o outro como alguém, é a mesma que, quando está tudo desmoronando, resgata o corpo.

Mais uma vez, com as próprias palavras do sermão:

“Se eu busco a Deus buscando um emprego e eu não tenho um emprego, eu fico de mal com Deus, então eu não estou buscando Deus, eu estou buscando um emprego e eu estou transformando Deus, que é Último, no meio para eu alcançar o Penúltimo que eu acabei de transformar em meu Último. E toda vez que Deus deixa de ser um fim e se torna um meio, ou ele foi confundido ou foi transformado em um meio, e aí ele se torna um ídolo.”

Em poucas palavras: relação idolátrica com o divino. O grande problema é que isso desfigura os seres humanos, que ao também se tornarem ídolos, “têm boca, mas não falam” (Sl 115.5). Ressalva é feita para o fato de que não se alega que Deus não possa trazer a você bênçãos, recursos financeiros, um bom casamento, enfim, prosperidade em toda e qualquer área da sua vida, mas que não deve ser esse o motivo pelo qual nos relacionamos com Deus4. O que faz o líder religioso execrado por Kivitz é tentar manter o fiel preso por ser um mediador entre a divindade e os que precisam de suas benesses5.

O problema, portanto, da Teologia da Prosperidade ou, para mantermos os termos, “religião commoditizada”, não são os elementos da relação, mas a disposição desses elementos. E é essa disposição dos elementos – equivocada ao transformar Deus, o ser último e a razão de tudo, em razão penúltima da existência – que irrita as teologias conscientes contra a religião commoditizada, pois elas perdem ainda mais espaço. O exemplo dado é o de elevar dinheiro à categoria de Deus, em outros termos, “Mamon”. Mais uma vez, os elementos não são o problema, mas a disposição deles. O problema não é o dinheiro, é elevá-lo à categoria de Deus – como se no mundo do fetiche da mercadoria, citado pelo próprio teólogo que não é nenhum bolchevique, já que se trata de uma constante assimilação totalizante, houvesse essa distinção.

Sendo o dinheiro o Deus deste mundo – afinal, “Deus é uma nota de cem” – e a religião commoditizada respaldando essa relação, o fiel, que perdeu sua autonomia, “é um ser facilmente manipulável, é um ser que a gente pode dizer que está subtraído da sua maturidade e da sua plenitude, é um ser infantilizado”. Ou seja, que involuiu. A evolução era a emancipação da consciência, o que acontece é o seu avesso – qualquer semelhança com o projeto kantiano da maioridade da civilização não é mera coincidência, basta lembrar que, para a genealogia dessa teologia, a modernidade, a consciência e o indivíduo são momentos do cristianismo.

Decorre disso (a infantilização ôntica pela transformação do último em penúltimo) a munição para aqueles que criticam a religião, o maior pesadelo da teologia madura que quer a paternidade dos entendidos de plantão. Nosso teólogo vai dizer que é vendo esses equívocos da religião – pois para ele são equívocos – que certos grupos têm possibilidade de dizer – depois de terem pontuado, mais uma vez, que “a religião é o ópio do povo”:  “você no seu sofrimento, na sua culpa, na sua agonia, você quer soluções, você se torna vulnerável à manipulação porque no fundo você é uma pessoa infantil, que não cresceu, que não assumiu sua responsabilidade na existência e você quer um papai do céu para resolver” as coisas todas ou “você quer solução penúltima para a sua vida” e não encara que é covarde e que tem que viver com a grandeza de quem sabe que está à sombra da morte e que não se abala frente a ela. É citada expressamente a trinca Nietzsche, Marx e Freud como os formuladores dessa acusação – cada um à sua maneira. Poderíamos dizer que, na verdade, essas são as palavras do próprio teólogo que tem que competir com a religião commoditizada, dado que é só ler com um pouco de paciência as primeiras linhas dos textos desses três pensadores para saber que não se trata de nada disso6.

Por fim, contra a escravidão e degenerescência da humanidade, o que sugerem as teologias das quais nosso pastor é um eminente formulador? O cristianismo, pois ele “é a superação da religião”. É preciso dizer mais alguma coisa? A respeito única e exclusivamente da formulação particular desse exemplo, sem levar em conta as outras formulações que muitas vezes são muito melhor elaboradas e mais radicais, que se trata de “um misto de senso comum com existencialismo requentado” – a frase é de Paulo Arantes, obviamente em outro contexto muito mais interessante que o nosso, por suposto.

O grande problema dessas teologias, que se mostram críticas ao mundo, é que apesar de “todo distanciamento subjetivo diante da prática” religiosa – em termos teológicos, a mudança do paradigma da referencialidade à Trindade a quem se deve obediência para o das imagens do ídolo e do santo7 – “longe de enfraquecer o ritual, reforça-o”. Ou seja, apesar de tentar fazer com que as pessoas saiam de uma suposta alienação que as prende a um sentido originário do texto ou a um Deus tirano – a depender da formulação e modalidade teológica –, a questão não é o conteúdo dessa religião, mas a forma mesma que nos faz ficar presos a certos dogmas – o da literalidade da Bíblia ou o de sua atualização por quaisquer primas que sejam. E isso tudo porque não é a religião, o ritual, os dogmas, doutrinas ou literalidades seculares que perdem seu sentido com essa crítica, senão “a crítica que se torna débil” porque “trata-se de um reforço à maior ilusão de nossa sociedade, a ilusão segundo a qual por aqui ninguém mais é bobo”8.

Como pudemos observar, o café teológico de Kivitz nos dá uma radiografia geral de seu pensamento e, por conseguinte, de sua construção enquanto líder de uma comunidade cristã no Brasil contemporâneo – modelo para muitas outras que entram na dança que estamos mapeando, obviamente. Teologia formulada justamente desde o início do presente século, quando da ascensão da segunda parte do bloco conciliador da redemocratização pós-ditadura: a parte popular do pacto, até então, apenas democrático. Trata-se de sua primeira obra dessa nova fase, Vivendo com Propósitos (São Paulo: Mundo Cristão, 2003), que dá as bases para seus ensaios de prática, a obra mais relevante porque até hoje faz parte de seus sermões, conferências e, de maneira estendida, é a palestra que acompanhamos algumas linhas acima: Outra Espiritualidade (São Paulo: Mundo Cristão, 2006) – a partir de agora, as páginas citadas desse livro serão colocadas entre parênteses no corpo do texto.

Seu projeto de igreja é, em suma, manifestar “aqui e agora, a maior densidade possível do novo céu e da nova Terra, que serão consumados ali e Além” (p. 38). Ao invés do “é chegado o Reino dos Céus” do cristianismo primitivo, a mesma máxima que envolve o mundo desde nossa última catástrofe: “there is no alternative”, que nos faz acomodar e dizer o autocomiserado “eu faço o que posso, não é possível fazer tudo” daqueles que dão as sobras no final do ano “para o bem estar de todos e alegria geral da nação”.

Interessante perceber, com o tempo, que o que eram as contradições de um líder eclesiástico que se debatia com seus dilemas acerca do seu projeto de igreja (tanto quanto organismo, como organização) se transformaram em esquizofrenia, percebida por uma leitura mais detida: três páginas depois de termos lido uma declaração contra o marketing na igreja, temos, dentre as “seis propostas afirmativas” para uma igreja relevante na pós-modernidade, o postulado de que “a igreja relevante valoriza a imagem”, pois “o mundo não é mais MS-DOS, mas Windows”9 (p. 99). Uma igreja que se tornou justamente, mais uma vez, o que é a principal crítica de nosso teólogo: uma igreja institucionalizada – ou seja, uma igreja com “liderança personalista”, com “ênfase na particularidade do ministério” e “ministração quase exclusiva à massa sem rosto”; em “busca de presença na mídia”, com “projetos ministeriais impessoais”, “apelos financeiros exagerados”, “rede de relacionamentos funcionais”, “rotatividade de chamados líderes leigos”, “forte presença de conteúdos simbólicos”, “ausência de liberdade às expressões individuais”, “falta de preocupação com o discipulado” e “proclamação utilitarista”10 (p. 85-88, grifos do autor). É a igreja enquanto empresa11: deve ter uma visão (o “botão de ignição”[p. 101]), não pode ser obsoleta, uma instituição em que há uma zona cinzenta12 entre “organismo” e “organização”. Com todas as palavras, uma “igreja relevante na pós-modernidade” (p. 97)13.

É verdade que o que se pontua aqui pode ser visto também por uma outra chave, a da melancolia – Freud, corre aqui com nosso luto! –, todavia, se essa melancolia é sucedida por um “there is no alternative, se quisermos continuar sendo igreja no Brasil do século 21”, ela se transforma em cinismo, o verdadeiro mal do século. Mais uma vez retomamos o círculo vicioso que identificamos, de modo que essa outra chave tem seu limite bem claro. Justamente por apostarem na consciência e no poder da linguagem – seja para se comunicarem ou para criarem outras imagens – entraram em sua “espiritosfera” – o termo é de Ed René Kivitz – ilustrada. O problema é que viver na história “com os olhos na eternidade” (p. 204) nos faz pisar, não perceber ou tropeçar em muitas coisas do chão da vida: um cinismo com roupagem evangélica.

Pensando no mercado eclesiástico ao qual aderiram nosso pastor e sua comunidade, entendemos a compatibilidade entre seu credo e as declarações de que é necessário atualizar a Bíblia14, ou qualquer insinuação que possa ser parecida com isso: as identidades também se tornaram um mercado. É o que Nancy Fraser chama de “neoliberalismo progressista” e Pablo Polese, de “capitalismo identitário”15 – nós acrescentamos a particularidade “evangélico” a cada um dos conceitos formulados pelos dois autores ora mencionados. 

Em uma palavra, o que vimos começar nos Estados Unidos, com o consenso de Washington e, no Brasil, com o bloco FHC-Lulismo, é “uma aliança de correntes predominantes dos novos movimentos sociais (feminismo, antirracismo, multiculturalismo e direitos LGBTQ), por um lado, e segmentos empresariais de serviços e ‘simbólicos’ de ponta (Wall Street, Vale do Silício e Hollywood), por outro”16. Como vivemos tentando copiar tudo o que vem do Norte das américas, o maior exemplo gospel disso é a própria Igreja Batista de Água Branca e irmãs, onde temos incentivos aos programas sociais de todas as formas (às vezes de púlpito, às vezes com seus respectivos braços filantrópicos com nome de “ação social” ou coisa que o valha), de um lado, e almoços com os maiores investidores e acionistas da cidade, do estado e do país nas quais essas organizações eclesiásticas têm sede – diga-se de passagem, os financiadores e investidores das “ações sociais”, tanto na Barra Funda como em New York. 

A formulação de Polese aprofunda mais o diagnóstico demonstrando como, a partir de pesquisas de mercado e de dentro do mundo corporativo, as empresas, de um lado, colocam quadros contados dos “novos movimentos sociais” em posições de liderança para, à revelia do esperado, submeter a condições ainda piores de trabalho os outros empregados negros, mulheres, LGBTs etc., em comparação com seus colegas brancos, homens, héteros, pelo ideal de que um dia chegarão lá, também poderão assumir os postos de liderança – afinal, eles também são Imago Dei, ou seja, um dia eles poderão deixar de sobreviver, e passar a transcender, crescer, conviver e construir17, tudo isso com base na santidade –; de outro lado, colocando alguns de seus expoentes para aparecer em propagandas publicitárias que fomentam o comércio desenfreado dos já endividados que foram incorporados pelo consumo, com bolsas aqui e ali, mais uma vez para mostrar que “yes, we can”, yes, você pode transcender, crescer, conviver e construir! 

De fato, o presbitério da igreja continua sendo composto majoritariamente por homens, senhores de idade, brancos, héteros e de classe alta. Cristalino o discurso cínico com oratória impecável que a realidade não contempla, tudo continua do mesmo modo. Se as teologias da prosperidade (a partir dos maduros na fé) têm por objetivo gerir a pobreza e os superexplorados, deserdados da terra, as teologias ilustradas, por seu turno, fazem a gestão dos que sobrevivem, transcendem, crescem, convivem e constroem algo, em suma, vivem com propósitos, tentando arrefecer, aclimatar e acalmar a ânsia autodestrutiva da guerra de todos contra todos nessa terra arrasada.

Ora, se não é o projeto do self-made man em voga nos Estados Unidos desde sempre e que desembarca por aqui nos anos 1990 com toda a força do neoliberalismo, que acredita que seu trabalho é seu propósito de vida (ou deve ser ou que se deve fazer o trabalho com um propósito, que ao fim e ao cabo são maneiras diferentes de dizer a mesma coisa: trabalhe!18); em suma, nosso teólogo se tornou um dos pastores de hoje, que tem seu planejamento estratégico para determinado público-alvo. Como nos disse um idealista alemão (o primeiro que veio da espiritosfera para a estratosfera no século 19), todo homem paga um tributo a seu tempo. Cumpriram seu papel na era da gestão.

Voltando à teologia cristã que viemos observando, tudo começa a se aclarar quando nos damos conta de que o pano de fundo dessa formulação é como “ganhar o mundo sem perder a alma” (p. 154). Uma resposta teológica poderia dizer que isso não é possível, pois “o mundo jaz no maligno”  (1Jo 5.19) e que quem junta para si montes e celeiros, no dia em que a vida é pedida, tem um destino não muito agradável. Um mais esperto nos informaria que, a despeito das aflições, temos certa chancela, pois está escrito: “tende bom ânimo, eu venci o mundo” (Jo 16.33) – essa frase é um dos maiores trunfos das teologias da prosperidade, seja a prosperidade pela falta ou a prosperidade da abundância, que estamos mapeando. Ora, sendo igreja, corpo do Cristo, deveria ser objetivo levar a cabo e dar corpo à vitória sobre o mundo, não aderir ao que jaz no maligno. Essa teologia se desfez de todo o seu potencial crítico e profético com relação ao mundo, como estamos percebendo. Logo, só resta tentar ganhar o mundo sem perder a alma. A interpretação dada a Mateus 16.25 não me deixa mentir (ela se encontra na coluna “Vivendo com propósitos” [p. 157-8]).

É essa impossibilidade – a da formulação de Kivitz et caterva – que a nova teologia conservadora – também combatida por nossa teologia neoliberal –, de maneira destrutiva, vem apontar. Nosso teólogo exemplar, com sua teologia, tenta atualizar a “ética protestante” esquecendo-se de que ela é “o espírito do capitalismo” (dentre outros, vale a pena conferir a coluna “O sentido do trabalho”) – vale lembrar que Walter Benjamin não estava indo contra Weber19, em seu manuscrito “capitalismo como religião”, mas aprofundando os achados do sociólogo. Esse o projeto levado a cabo pelo bolsonarismo, só que agora em modo “raiz”, como costumam dizer, sem proteção do Estado, sem “privilégios” de gente que quer “furar a fila” pela corrupção ou bolsas-isso, bolsas-aquilo. Aquilo que nosso pastor exemplar percebe de maneira resignada, na coluna “Daí a César o que é de César”, todo mundo já sabe, como pudemos colocar algumas linhas antes, mas agora, ao contrário de nosso bom mocismo cristão protestante que vive na espiritosfera, a mudança radical e real, nas palavras de Miguel Lago, a primeira revolução de verdade na história brasileira. Silvia Viana, com palavras diferentes, tem muito a dizer sobre o momento em que vivemos, percebendo exatamente essa mudança20

Talvez isso explique um pouco o paradoxo de um pastor bom moço e bem intencionado que prega para auditórios coloridos de verde e amarelo em dias de manifestação, desde 2016. Realmente aconteceu o que ele não via com maus olhos (“presidente evangélico – quem sabe?”), teve o que ele mais temia (“governo evangélico, jamais”) (p. 213). Talvez isso se deva, mais uma vez, ao fato de nosso pastor viver na história “com os olhos na eternidade”.

Uma palavra sobre o paradoxo (que para os apocalípticos, para falar como mais uma das inspirações de nosso teólogo exemplar, é mais uma das faces do já mencionado mal do século), indício que deixa os mais atentos também de orelhas em pé e que futuramente, com antropólogos e sociólogos da religião, há de ser explicado: desde o mencionado ano, nos cultos da noite, em dias de manifestação, a Igreja Batista de Água Branca tinha seu púlpito vestido de preto e seu auditório, de verde e amarelo. A muitos parece uma loucura o fato de que o auditório frequenta atos políticos cujo conteúdo é anátema para seu principal pregador, qual seja: “Deus abençoa quem se sacrifica, honra quem persevera e abomina quem retrocede” (p.  79). Poderíamos dizer muitas outras coisas, mas a epígrafe de seu volume O livro mais mal-humorado da Bíblia (São Paulo: Mundo Cristão, 2009), citação de Luiz Felipe Pondé, já nos diz tudo: “O Eclesiastes deixa claro que o Deus de Israel não gosta de covardes”. A partir disso, uma nova pergunta nos aparece: quem não entendeu o que nosso teólogo estava querendo dizer? O auditório verde-amarelo ou nós que criticamos o verde-amarelismo do público que o ouve?

Notas:

1. O termo “exemplar” aqui se refere ao fato de que sua formulação contém de modo claro os parâmetros dessa teologia e serve de base para muitas outras com o mesmo intuito. Em momento algum nos referimos à hipótese de uma relação hierárquica ou de autoridade.

2. A ver pelo Brasil, como último exemplo.

3. A esse respeito, basta ver os mega eventos cristãos patrocinados por grandes empresas, os cantores que cantam dominicalmente em igrejas reformadas, têm mais de um milhão de seguidores nas redes sociais e fazem “#publi” para as redes mais diversas, desde editoras cristãs a companhias de viagem.

4. Em uma palavra, a questão para essa teologia não é você desejar todas as coisas do mundo, como viajar nas férias para as ilhas gregas, para a Europa, para a Disney ou para o raio que o parta, desde que não se use Deus como um meio para essas coisas ou para quaisquer outras, pois Deus é um fim em si (seja lá o que isso queira dizer).

5. Já aí se poderia colocar o interessante fato de que essas teologias são sempre acusadas de falarem aos necessitados. Talvez porque os abastados não precisem desse Deus, afinal têm outros meios de terem o conforto que as pessoas que trabalham de maneira precarizada não têm. A questão da sobrevivência não é algo que importe para os cristãos empregados com ordenado garantido mensalmente, ele já está garantido.

6. Vale aqui um breve comentário a esse respeito. É famosa a citação de que Marx teria dito que “a religião é o ópio do povo”. Ninguém o nega. Todavia, usando as palavras de nosso teólogo exemplar, “texto fora de contexto é pretexto”. Não temos tempo nesse momento para retomar toda a discussão acerca da religião na Alemanha do século 19, principalmente porque após a morte de Hegel seus discípulos se dividem. Isso porque a questão da religião era uma das pedras de toque da filosofia hegeliana – para os desavisados, esteve no radar de Georg Wilhelm Friedrich se tornar teólogo. Também não reprisaremos aqui todo o pensamento do filósofo alemão nascido em Stuttgart a esse respeito (além de seus próprios escritos, existe uma biblioteca sobre isso). Importa dizer que, do mesmo jeito que nosso teólogo exemplar, na segunda metade dos 1800 também já se fazia uma crítica da religião (ou seja, não é novidade nenhuma o que estamos acompanhando), seja para refutar a religião, seja para propor uma nova teologia. Não é à toa que a citação sobre o ópio, de importância capital, esteja numa introdução a uma crítica feita por Marx à filosofia ou teoria do Estado hegeliano – que não tem nada a ver com aparelho administrativo, mas com sociabilidade, como o próprio Kivitz já colocou que é ou foi um dos papéis da religião. Voltemos ao citado crítico de Hegel. Geralmente se remete a essa frase para dizer que, no caso, a religião seria como algo que escraviza e vicia, que deixa dependente e que não faz ver a vida como ela é. Vamos ao texto. A referida frase (“a religião é o ópio do povo”) está no quarto parágrafo da “Crítica da filosofia do direito de Hegel – Introdução” (In.: Karl Marx, Crítica da Filosofia do Direito de Hegel. 2 ed. Revista. São Paulo: Boitempo. 2010). Já de início, o autor introduz o assunto da crítica da religião (parágrafo primeiro), diz que na religião o homem encontra um reflexo de si mesmo (parágrafo segundo), e que, na verdade, é o homem que faz a religião e não o contrário (parágrafo terceiro). Até agora também não vimos nenhuma novidade, o próprio Kivitz nos diz isso a respeito da comoditização da religião. E aí entramos no trecho (parágrafo quarto) em que o autor coloca que “a miséria religiosa constitui ao mesmo tempo a expressão da miséria real e o protesto contra a miséria real” – não é isso que estamos vendo? Uma crítica da religião feita por um teólogo para colocar, junto com isso, seu protesto? – ele continua: “A religião é o suspiro da criatura oprimida, o ânimo de um mundo sem coração, assim como o espírito de estados de coisas embrutecidos” – quem não concorda com tal afirmação e não se emociona ao constatar a realidade disso? – e, por fim, sentencia: “Ela é o ópio do povo”. Percebemos que o problema da religião não é o vício, mas a alienação, que é, como vimos, uma forma de resistência do homem que foi eficiente há até pouco tempo (sempre segundo o idealismo hegeliano do qual Marx era discípulo à época) e que nos faz, de um lado, poder contestar as coisas e, de outro, dormir em paz sem nos percebermos como parte do problema. Fiquemos por aqui com o comentário. Vale ressaltar: os grifos são sempre do autor e todas as citações constam da página 145 da referida edição. A respeito da questão da religião e do cristianismo para Nietzsche, conferir a palestra da professora Scarlett Marton, cujo título é “Cristianismo: da má filologia à corrupção dos instintos” proferida no XVIII Encontro Anpof (disponível em: https://youtu.be/PDfN7okHXfg. Último acesso: 18/05/2021). Quanto à segunda parte do título não sei, mas quanto à primeira, dado que para Nietzsche filologia tinha que ver com boa leitura de texto, pelo que vimos (cotejando a afirmação corriqueira sobre a leitura da relação entre religião e ópio e o que realmente ela significa) talvez ele esteja certo. A respeito de Freud, para uma breve introdução vale ler a resenha feita por Maria da Penha Fornandari Antunes a respeito de uma antiga edição brasileira da tradução dos textos freudianos que tratam da questão da religião (O futuro de uma ilusão, Revista da Faculdade de Educação. Nº 78, 2007. pp. 171-176).

7. Para a formulação completa desse paradigma, cf.: Ed René Kivitz. Santidade. São Paulo: Mundo Cristão, 2020.

8. Seguimos aqui os passos da socióloga Silvia Viana em seu livro sobre reality shows (Rituais de Sofrimento. São Paulo: Boitempo, 2013. p. 27). Apesar do assunto diferente, o que foi dito se aplica da mesma forma ao que estamos tratando aqui, justamente porque se trata da tentativa de desmistificação que só reforça a fantasia ideológica de nosso tempo, qual seja, a de que “por aqui ninguém mais é bobo” e continua vivendo como se fosse.

9. Marketing esse que em suas próprias palavras é “o último dos filhos do institucionalismo, (…), o proselitismo, a absolutização do marketing religioso institucional em detrimento do ministério do Espírito que convence do pecado e revela o Cristo” (p.50). Obviamente o objeto de crítica de nosso teólogo exemplar era outro, mas, pela esquizofrenia já identificada, se tornou réu do próprio critério. A ver pela diferença entre os orçamentos mensais para o aluguel do estabelecimento que comporta o CNPJ IBAB e o orçamento anual arrecadado ao final do ano para a filantropia realizada ao longo dos doze meses seguintes para mais de cinquenta instituições de ação e serviço social.

10. Faço referência aqui à coluna cujo título é “As marcas da institucionalização da igreja”. Poderíamos longamente falar sobre cada ponto, nos deteremos apenas em dois: ministração quase exclusiva às massas sem rosto e  rotatividade de líderes chamados leigos. Quanto ao primeiro, os estudos futuros ainda dirão com precisão, mas a hipótese ora aventada é a de que os cultos da IBAB, outrora feitos para quem assistia presencialmente os cultos, hoje, versão gospel do TED-Talks, começou essa transformação desde a vinda do pastor Erwin McManus, pastor de uma mega igreja em Los Angeles, chamada Mosaic Church, em 2014, recebido como um rei pelos membros da periferia da cidade de São Paulo, já instalados ao lado da estação Barra Funda. Esse senhor é um sessentão que não quer perder a pose nem a virilidade de um homem no auge dos seus trinta anos. Dúvidas? Favor colocar seu nome em qualquer site de busca e se atentar para as imagens que aparecem. O ciclo analisado nessas poucas linhas – em que a referida igreja e seu pastor levam a cabo o que ele mesmo chama de institucionalização da igreja, como vimos – tem sua finalização em 2018, com a chegada do cantor gospel Paulo Cézar Baruk ao staff, de modo que em nada alterou a pandemia na situação que analisamos. Quanto ao segundo ponto, basta conversar um pouco com aqueles que passaram pela despedida sem explicação e com o motivo de qualquer outra empresa que existe na face da terra e que só tem olhos para os lucros (sejam eles monetários ou de engajamento): “seu ciclo aqui acabou”.

11. Vale a observação de que em sua dissertação (Ed René Kivitz. Espiritualidade no mundo corporativo: aproximações entre prática religiosa e vida profissional. Dissertação [Mestrado em Ciências da Religião] – Faculdade de Filosofia e Ciências da Religião, Universidade Metodista de São Paulo. São Bernardo do Campo, p. 141, 2007), nosso Exemplo estudou justamente as aproximações entre a fé e os negócios, chegando à conclusão de que eles eram, em tese, incompatíveis, dada a premência do lucro em detrimento de certos valores cristãos, no business. Ao que parece, não muito tempo depois, foi transplantada a lógica dos negócios para a corporação eclesiástica.

12. Zona cinzenta é um termo que, a depender da sociologia que se lê, nos faz arrepiar até o último fio de cabelo. De igual modo ela pode causar arrepios, se nos lembrarmos da síntese que se encontra em Mateus 7.21-23.

13. Para quem quiser saber, vale conferir os pormenores, mas, em tópicos, é uma igreja (1) “plural em suas ofertas”, (2) “descentralizada em sua operação”,  (3) “inclusiva em seu horizonte de relacionamentos”, (4) “valoriza a experiência”, (5) “cria comunidade” e (6) “valoriza a imagem”. (pp. 97-99).

14. Em tempo: o presente artigo foi finalizado em agosto de 2021, portanto, quase quatro meses antes do infeliz desligamento que sofreu Ed René Kivitz da também infeliz Ordem dos Pastores Batistas. Além da mensagem que ensejou todo o processo que culminou no desfecho citado, após a decisão final da mencionada Ordem (?), foi publicado um documento no qual o pastor da IBAB ratifica e explica suas posições (Ed René Kivitz. Sobre atualizar A Bíblia (In)Suficiente. Online. 2021). Após a leitura do documento, ratificamos o percurso feito dentro dos limites deste trabalho. Voltemos, pois, ao corpo do texto.

15. Dos autores, cf.: Nancy Fraser. Neoliberalismo progressista versus populismo reacionário: a escolha de Hobson. In: Arjun Appadurai et al. A grande regressão: um debate internacional sobre os novos populismos e como enfrentá-los. São Paulo: Estação Liberdade, 2019.; Pablo Polese. Machismo, racismo, capitalismo identitário: as estratégias das empresas para as questões de gênero, raça e sexualidade. São Paulo: Hedra, 2020.

16. Nancy Fraser. Op. Cit.  p. 78.

17. A referência é à Magnum Opus de nosso teólogo exemplar, o já citado, Vivendo com propósitos (Op. Cit.).

18. Mundo do trabalho esse que, de acordo com pesquisa colocada pelo nosso teólogo, tem 70% da amostragem de seus executivos “com índices elevados de estresse, 80% têm alimentação desequilibrada, 65% são sedentários e 60% estão acima do peso”. A lista continua: “40% fumam e 50% consomem bebidas alcoólicas regularmente” (Ed René Kivitz. Outra espiritualidade. Cit. p. 148). Esse é o admirável mundo novo de contenção do pior para os de cima. Para os de baixo, temos o desemprego, a fome, as mesmas (e algumas outras mais) drogas, violência, escrachos, linchamentos e teologia da prosperidade, além das já repisadas ausência de seguridade social, saneamento básico e educação.

19. Se fôssemos historiografar as relações entre modernidade e protestantismo, partindo de seus vários estudos sobre as religiões e a modernidade, provavelmente encontraríamos uma miríade de outras de afinidades eletivas, principalmente com relação à dominação e ilustração.

20. Da autora citada, cf.: Acabou! Argumentum. v.11, n.2. 2019. pp. 17-30. Tentando perscrutar os elementos cristãos desse “Acabou!”, Fellipe dos Anjos e João Luiz Moura (O contágio infernal: o apocalipse bolsonarista-evangélico. São Paulo: Recriar, 2020) nos dão elementos preciosos para pensar.