Teorias da conspiração elaboram soluções simplistas para problemas complexos baseadas em uma falsa fé, comunicando medo e desconfiança entre os cristãos


Por William McCall | Adventist Today – Traduzido e adaptado por André Kanasiro para a revista Zelota.

“Não chamem conspiração tudo o que esse povo chama conspiração; não temam aquilo que eles temem, nem se apavorem. Ao Senhor dos Exércitos é que vocês devem considerar santo, a ele é que vocês devem temer, dele é que vocês devem ter pavor.”
(Isaías 8:12-13, NVI)

Os alemães tinham sido humilhados e estavam amargurados com o Tratado de Versalhes após a 1ª Guerra Mundial. Um soldado condecorado que servira no exército alemão se convenceu de que a razão pela qual a Alemanha tinha perdido a guerra foi sua traição por um “inimigo interno”. Este inimigo, é claro, eram os judeus, e o soldado era Adolf Hitler.

Transformar judeus em bodes expiatórios era uma tradição há muito estabelecida na Europa, mas a diversidade crescente da Europa pré-1ª Guerra a fez emergir novamente na Alemanha e na Áustria. Após a guerra uma população amargurada, especialmente entre os militares, foi atraída pelo antissemitismo como forma de vindicar o orgulho alemão e fornecer-lhes um bode expiatório para os seus fracassos. Não importa há quantos séculos os judeus tinham vivido na Alemanha, eles sempre foram suspeitos por terem lealdades para além da Alemanha. Não foram a Alemanha e o nobre soldado alemão que perderam a guerra. Eles tinham sido traídos por “forasteiros” que não eram verdadeiramente alemães.

Em 1928, um livro chamado Os Protocolos dos Sábios de Sião foi traduzido para o alemão. Este livro pareceu fornecer provas de uma conspiração judaica mundial, e deu credibilidade aos antissemitas na Alemanha. O problema é que ele era uma fraude, uma obra de ficção repleta de plágios que fora editada para se parecer com um documento oficial. Primeiro publicado na Rússia czarista, onde serviu como justificativa para massacres de judeus, ele posteriormente reforçaria a percepção nazista da Alemanha e dos problemas da Europa.

Um livro que alegava desmascarar uma conspiração tornou-se parte de uma conspiração. Mesmo que o livro fosse uma fraude, ele recebia uma devoção quase religiosa das pessoas que queriam acreditar nele.

Teorias da conspiração sempre existiram. Elas não se limitam a uma cultura ou nacionalidade. Elas são encontradas em todos os lados do espectro político, e não são domínio exclusivo de conservadores ou liberais. Mas se nós, como cristãos, valorizamos a Verdade, elas não deveriam ter lugar entre nós. Seguem abaixo algumas formas através das quais teorias da conspiração representam uma falsa religião.

Teorias da conspiração exigem fé

Teorias da conspiração são impossíveis de serem provadas por natureza. Se elas fossem passíveis de serem provadas, elas não seriam mais uma teoria, mas um fato estabelecido. Na ciência ou em investigações policiais você pode começar com uma teoria, mas se ela não for reforçada por fatos ela deve ser descartada. Se um detetive se apegar a uma teoria falsa, a pessoa errada será condenada. Seu viés fechou seus olhos para os verdadeiros vilões.

Esta é sem dúvida a oficina do diabo. Ele sempre quer nos cegar para o verdadeiro inimigo, o verdadeiro perigo para nossas almas. A ironia das teorias da conspiração é que quanto menos evidências estão disponíveis, mais vigorosamente seus fiéis as defendem. O termo “a grande mentira” foi cunhado por Hitler para descrever esse fenômeno. Como as pessoas querem acreditar — já que teorias da conspiração fornecem “evidências” que confirmam seu próprio viés — as pessoas se apegam a elas. Alegações não devem ser confundidas com evidências.

Como regra geral, quanto mais pessoas estão envolvidas em uma teoria da conspiração, menor a probabilidade de que ela seja verdade; isso porque quaisquer vazamentos, traições e arrependimentos a desfariam. Algumas teorias da conspiração exigem a cooperação de milhões de pessoas ao redor do mundo. A crença em conspirações cria uma cosmovisão bastante cínica, aliena aliados em potencial, e nos tira de caminhos para verdades em potencial. Mesmo que seja verdade que as pessoas são pecaminosas, a maioria não é ruim. Elas são simplesmente peregrinas em luta, tal como você e eu. Cristãos não devem ter fé em qualquer um ou qualquer coisa além de Deus.

Teorias da conspiração expressam justificação própria

“O espírito de justificação própria originou-se com o pai da mentira,” escreveu Ellen White (PP 29). Isso faz parte de seu poder sedutor. É com frequência indevida que muitas pessoas, quando fatos não se adequam a seus preconceitos, adotam teorias da conspiração para justificar suas crenças, ao invés de alterá-las para se adequar às evidências. Como toda forma de pecado, elas têm uma compensação. Elas são uma forma passivo-agressiva de ventilar nosso ódio. Elas são uma forma de justificação por comparação. Podemos nos sentir bem conosco, já que nossos inimigos são tão maus.

Mas isso não é piedade. Jesus é a Verdade. Todos os que adoram a Jesus devem amar a verdade. Mesmo que a fé seja a evidência de coisas invisíveis, nossa fé deve estar em Deus, não em teorias feitas pelo homem.

Teorias da conspiração são fofoca

Os adventistas são aconselhados a sequer dar ouvidos a fofocas. Mas de algum modo nos permitimos quando a fofoca é a respeito de alguém que não conhecemos pessoalmente.

Muitas teorias da conspiração são mera fofoca. Cristo nos disse para “vigiar!”, não especular. “Vocês ouvirão falar de guerras e rumores de guerras, mas não tenham medo.” Se cremos em Cristo, sabemos que todos os sinais que precisamos reconhecer serão observáveis para todos. Por que precisamos nos engajar em especulações, rumores ou fofocas para reforçar nossa fé? Devemos vigiar e esperar. Especular só resulta em descrédito para nós e nossa mensagem.

Teorias da conspiração demonizam as pessoas

“A nossa luta não é contra pessoas,” diz o apóstolo Paulo, mas “contra as forças espirituais do mal” (Ef 6:12). Comunidades disfuncionais frequentemente precisam de um inimigo para conquistar unidade social — mas esta é uma falsa unidade. Será que se os alemães tivessem sido capazes de eliminar todos os judeus eles se tornariam unidos e leais? É claro que não. Seres humanos são seres humanos.

É incrível quanto poder imputamos aos nossos inimigos. Isso é não somente paranóia, mas também é uma forma de idolatria. Nem o diabo é onipotente! Por que passar tanto tempo pensando nele?

Ellen White falou do pecado da “suspeita e da discórdia” [no original: “suposição do mal”], que significa projetar motivos em pessoas. “Dará Ele [Cristo] êxito ao Seu povo antes de removerem eles o lixo da suspeita e da discórdia?” ela pergunta retoricamente (CI 42). Esta suposição do mal pode ser o que psicólogos chamam de projeção, quando imputamos a outros nossos próprios pecados. A medida pela qual julgamos é um julgamento sobre nós mesmos, pois somos frequentemente culpados do próprio pecado que vemos nos outros. Ninguém pode julgar o coração. Essa é a tarefa de Deus.

Teorias da conspiração oferecem soluções falsas e simplistas

Conspirações substituem questionamentos legítimos por uma falsa certeza. Todos nós almejamos um sentimento de ordem. Todos nós odiamos a insegurança de não saber. No mundo das teorias da conspiração não há acidentes. Todo mal que acontece foi de algum modo planejado e desencadeado pelas pessoas que tememos.

A verdade sempre é muito mais complicada, porque as pessoas são elas mesmas complicadas. Existem acidentes, reveses e infortúnios no mundo. Os planos mais bem preparados resultam em consequências não planejadas. O diabo não está no controle de tudo.

Teorias da conspiração reforçam o orgulho

As conspirações são sectárias por natureza. Não acredite em seus olhos mentirosos. Não acredite na mídia. Nós temos informações secretas que ninguém mais tem. Somente nós temos a verdade. Quase como uma forma de gnosticismo, oferecemos a salvação através de informações ocultas ou secretas.

Em contraste, o evangelho foi proclamado como um mistério desvelado, uma verdade revelada. O verdadeiro discipulado é revelado por nosso comportamento, não nossas opiniões. Nós não somos salvos por conhecimentos esotéricos.

Teorias da conspiração nascem do medo e da paranoia

Na verdadeira vida cristã o amor lança fora o medo (1Jo 4:18). Mas em um mundo hiper-politizado, somos encorajados a entregar nossas mentes a seitas que demonizam nossos inimigos. Teorias da conspiração nos encorajam a odiar nossos inimigos.

Mas Cristo nos disse para amar nossos inimigos “fazer aos outros o que vocês querem que eles lhes façam.” Você gostaria de ser julgado por rumores e fofocas? Você gostaria que as pessoas tirassem suas palavras de contexto e imputassem motivos malignos a todas as suas palavras e ações? “A verdade pode se permitir ser justa” (CW 25:2, tradução livre). Teorias da conspiração tratam alegações como fatos. Elas se apoiam em informações ocultas. Elas reforçam preconceitos e encorajam o cinismo. Elas são sectárias por natureza e nos deixam abertos a manipulação: “Você não pode confiar neles, mas pode confiar em nós.”

Na melhor das hipóteses, teorias da conspiração são uma perda de tempo. Na pior das hipóteses, elas alimentam os elementos mais baixos e vis da natureza humana. Mesmo nossos inimigos merecem um julgamento justo. Se nós cremos na verdade devemos exigir evidências. A verdade de Jesus é observável e demonstrável; “por seus frutos os conhecereis.” Teorias da conspiração exigem fé por natureza, mas é uma fé falsificada e uma forma de auto-ilusão.

“Portanto, não tenham medo deles. Não há nada escondido que não venha a ser revelado, nem oculto que não venha a se tornar conhecido.”
(Mateus 10:26)